08 outubro 2018

Brasil em Transe: necropsia do primeiro turno

08/10/2018


- Bolsonaro venceu porque encarna o candidato anti-sistema, ao personificar o sentimento "contra tudo que está aí". entretanto, ninguém melhor do que Bolsonaro para representar o que há de pior na classe dominante no Brasil;

- as Eleições de 2018 marcam a obsolescência da TV e das pesquisas eleitorais como arma de manipulação da população, função agora executada com mais alcance e eficácia por um processamento online através das redes sociais e dos aplicativos de troca de mensagem;

- o mito Bolsonaro é uma bolha de pós verdade mantida inflada por um fluxo incessante de fake-news. mas todas as bolhas são infladas apenas para virem a estourar. e como Bolsonaro não passa da representação mais genuína de "tudo que está aí", seu governo está fadado a ser mais um estelionato eleitoral, aprofundando a crise de representação e encurralando o Brasil no beco sem saída da via institucional;

- por sua vez Haddad não pode, e não quer vir a ser, o candidato anti sistema. tanto por se recusar a fazer a crítica do Lulismo como pela insistência em se manter disponível para um pacto com a classe dominante;

- a principal crítica a ser feita ao Lulismo não é seu envolvimento com a corrupção sistêmica brasileira, e intrínseca ao Capitalismo, e sim o abandono da organização pela base e a despolitização da população, com o consequente esvaziamento dos movimentos sociais;

- a insistência do Lulismo, e de Haddad, num pacto com a classe dominante é um sonho impossível. longe de estarmos num período de expansão, o atual ciclo de "ajustes" e contração do Capitalismo globalizado implica numa imediata e violenta espoliação da renda, do patrimônio e dos direitos coletivos;

- os mitos Lula e Bolsonaro, assim como seus seguidores, são em vários aspectos equivalentes, dominados por um forte componente irracional avesso a toda e qualquer crítica. ambos exigem a figura da liderança salvadora, que, de fora para dentro e de cima para baixo, conceda à sociedade uma solução mágica para livrá-la de seus dilemas e demandas;

- não há nenhuma solução mágica para os nossos problemas. ninguém irá resolvê-los a não ser nós mesmos, através de nossa luta coletiva e organizada;

- o sistema de poder está ruindo. em seu vácuo surgem os fenômenos bizarros e as criaturas monstruosas, como um dos sintomas mórbidos da reorganização política da classe dominante. Bolsonaro e suas crias são a primeira ninhada deste processo, o qual neles não se completa pois a cadela do fascismo está sempre no cio;

- a Esquerda continua perdida no tempo e no espaço, como se ainda vivêssemos em 2002 e fosse viável uma reedição de Lulinha Paz e Amor e sua "Carta aos Banqueiros Brasileiros".

- os dias mais difíceis ainda nem começaram...

p.s.:

hoje na chegada ao Rio de Janeiro, foi assustador se deparar com uma cidade inusitadamente deserta.

desde a Dutra, passando pela Linha Vermelha, Francisco Bicalho, Presidente Vargas. nenhum engarrafamento e pouco movimento.

Centro, Bairro de Fátima, Ipanema, Botafogo, Laranjeiras, por todo lado pouca gente e pouco trânsito.

indagando a algumas pessoas, inclusive moradores de subúrbios e periferia, a percepção era a mesma: pontos de ônibus e comércio vazios.

além disto, uma atmosfera lúgubre, com a chuva fina e vento constante, criava um clima de enterro por toda parte.

alarmado, cogitei do que poderia se tratar: já teriam matado a viadagem toda? as mulheres teriam sido reconduzidas para a cozinha? os negros para a senzala?

as pessoas estão deprimidas e com medo. com muito medo. à beira da síndrome de pânico.

agora à noite, pouco antes de postar o texto acima, começo a escutar uma gritaria. o som reverberava vindo das ruas abaixo. a palavra de ordem se ouvia nitidamente: "#EleNão!".

vozes da juventude, percorrendo os quarteirões, soltando morteiros e angariando adesões.

por alguns minutos, a atmosfera de velório se dissipou em perspectiva de luta.

ir ao combate sem temer. ousar lutar, ousar vencer. somente a luta muda a vida! unidos somos muito mais fortes!
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