31 dezembro 2007


skyline pigeon

se é tão melhor ser bom, por que alguns decidem ser maus? [1]

pelo quarto escuro e solitário projetam-se sombras de melancolia e desolação. e meus olhos são espelhos do mundo lá fora. [2]

sem que interesse por quê, enquanto escrevo posso ouvir pela janela uma antiga música romântica. a melodia vem da direção em que se perdem os sonhos há muito deixados para trás.

a cada vez que se abre o peito, algo escapa, como pombas libertam-se de mãos que as aprisionam e voam para a linha do horizonte.

uma geração inteira encara seu destino: o mergulho no abismo, em busca da luz do abismo.

numa terra imperfeita, cheia de gente imperfeita, o que é ser bom? como é possível ser justo?

por que praticamos tantas atrocidades? em nome da justiça? ou por não querermos ser bons?

neste mundo cheio de matizes, qual o caminho correto entre a bondade e a justiça?
só a arte pode trazer a resposta. [3]


[1] Reinaldo Azevedo, “Iscailainepijonflai”
[2] Skyline Pigeon, Elton John
[3] arkx, comentário no blog do Reinaldo Azevedo, “Iscailainepijonflai”

22 dezembro 2007

merda doce merda

nos tempos do Chile de Allende e de seu governo da Unidade Popular, Maria da Conceição Tavares declarou num desabafo exemplar: “É um governo de merda, mas é o nosso governo de merda.”

depois de 34 anos, a frase é repetida no Brasil de hoje pelos defensores incondicionais do governo Lula: "sei que não quero entrar na história como linchador de Lula e de um governo que ajudei eleger”. [1]

a queda de Allende, na manhã da terça-feira 11 de setembro de 1973, tornou-se uma data trágica e sempre relembrada pela Esquerda.

bem menos se recorda, porém, a posse de Pinochet como chefe das Forças Armadas chilenas, nomeado pelo próprio Allende não mais que poucos dias antes do golpe. [2]

embora Pinochet estivesse conspirando em segredo há mais de um ano, aos olhos de Allende se tratava de um homem leal: o “nosso” Pinochet.

assim que surgiram as primeiras notícias do golpe, Allende teria ordenado: "Chamem o Augusto, que é um dos nossos".

o chamado de Allende foi atendido com uma exigência de rendição e a oferta de um avião com destino ao exílio. numa comunicação para os demais oficiais golpistas, interceptada por um radioamador, revela-se a real intenção de Pinochet: "No caminho os jogaremos de lá". [3]

como explicar a atitude de Allende? um quadro político não age por acaso nem por impulsos repentinos. será que ele queria mesmo era morrer? esse é o grande enigma. um denso mistério que não pode ficar debaixo da terra junto com seu corpo. [4]

com a eleição de Lula, parecia ter sido derrotada a poderosa discriminação social brasileira, o preconceito de classe absurdamente alto num país com tradição racista. mas, para quê? para governar para os ricos. e os ricos consentem, desde que os fundamentos da exploração não sejam postos em xeque. é o que o Lula faz: uma hegemonia às avessas. [5]

ao negar-se a decifrar o enigma do auto-engano em que se imobilizou, parte da Esquerda apela para o argumento definitivo : “mesmo que fosse contra todas as políticas do Governo Lula, ainda assim seria a favor dele.” [6]

além de esquizofrenia política, tal raciocínio se constitui num grave problema de ética. [7]

por que parcelas da Esquerda sempre repetem os mesmos erros? algum insuperável impulso kamikaze?


[1] Bernardo Kucinsky, “O Natal da discórdia”
[2] Pinochet tomou posse em 25/08/1973
[3] Patricia Verdugo, “Interferência Secreta”
[4] Bernardo Kucinsky, “O bispo de Barra quer morrer”
[5] Francisco de Oliveira, “Hegemonia às avessas”
[6] Wladimir Pomar , “Declaração de Voto”
[7] arkx, "o nosso governo", 05/10/2003

21 dezembro 2007

suicídio

quando a razão se extingue, a loucura é o caminho? [1]

quantas vidas valem a vida de um rio e de seu povo?

o bispo de Barra quer morrer? é obvio que o que ele quer mesmo é morrer... [2]

então, faça o favor de morrer logo. prometem enviar flores. [3]

por que incomoda tanto a atitude do bispo?

por que a atitude do bispo incomoda tanto o governo? por que incomoda tanto algumas pessoas?

o PT foi fundado sob a premissa de não apenas apoiar-se no movimento social como colocar-se a serviço dele.

hoje, o PT não apenas está completamente desvinculado de sua base social histórica, como se tornou um instrumento de neutralização e desmobilização do movimento social.

o bispo incomoda tanto por ser liderança de um dos poucos setores da sociedade que não se desestruturou inteiramente no governo Lula.

durante um ano, de 04/10/1992 a 04/10/1993 [4], o bispo "suicida" realizou uma caminhada ao longo do Rio São Francisco, da nascente a foz.

visitou todas as comunidades, realizou palestras nas escolas – desde o pré-primário até as universidades. debateu os objetivos da caminhada com os meios de comunicação, com os grupos organizados e associações de bairro, com as entidades, câmaras de vereadores e prefeituras .

o bispo incomoda tanto por não ser possível silenciá-lo, comprá-lo. para que desfrute da conveniente ida de Lula ao paraíso através do pacto sinistro firmado pelo governo entre os grandes investidores, agraciados com os juros do Copom, e os miseráveis, mantidos desmobilizados pelo Bolsa Família.

incomoda tanto por não aceitar ser refém do impasse suicida no qual a maior parte da Esquerda se aprisionou: “É um governo de merda, mas é o nosso governo de merda.” [5]

afinal, tem certas coisas, no que tange a favorecer os que dominam fingindo defender os explorados, que só Lula é capaz de fazer...

em algum momento, infelizmente mais tarde do que cedo, os setores progressistas da sociedade brasileira enfim se renderão a inexorável compreensão do mal causado pelo apoio que incondicionalmente empenharam ao governo Lula.

por vários e vários motivos, Lula tudo confunde e nada explica, com sua dubiedade e sua arrogância, suas meias-medidas e sua vã onipotência, o que faz com que um país inteiro se paralise, prisioneiro de uma encruzilhada e de uma esfinge, sem que possa dar uma resposta simples a tão incômoda pergunta:

- como pode um governo dos trabalhadores executar tão bem a política dos patrões?

quando finalmente a resposta óbvia que os progressistas tanto teimam em deixar oculta não mais se for capaz de evitar, o impasse brasileiro terá se aprofundado a tal ponto que já não mais será possível nenhuma saída pactuada.

nada pior do que negar a realidade. ainda mais em nome de avanços frágeis, promessas destinadas a frustração e absoluta falta de compromisso com princípios e ética na política.

assim como os indivíduos, países e sociedade são responsáveis por seu destino. em última instância, nos tornamos aquilo que escolhemos. e o momento da opção já passou para o Brasil...

talvez o bispo seja um "suicida"? pode ser... quando a razão se extingue, a loucura é caminho? não sei...

nada porém é mais certo que Lula empenhou sua palavra num acordo com o bispo, e não cumpriu!

o bispo incomoda tanto por se tratar de uma questão de princípios! de se fazer valer a palavra empenhada! de se honrar compromissos assumidos!

e nada pode ser mais incômodo para os fariseus que nem todos aceitem se tornar semelhantes a eles.



[1] D. Luiz Cappio
[2] Bernardo Kucinski, “O bispo de Barra quer morrer”, Carta Capital, 11/12/2007
[3] comentário de Arlete Santos, no Blog do Nassif, 07/12/2007
[4] 4 de outubro: dia de São Francisco
[5] Maria da Conceição Tavares, no Chile antes da derrubada de Allende, ciatada por Bernardo Kucinski, “O Natal da discórdia”, Carta Maior, 18/12/2007

20 dezembro 2007

indústria da seca

em 1959, Celso Furtado foi chamado por JK para estudar e traçar um plano para o Nordeste. cumprindo essa missão, o economista paraibano chegou a conclusão de que não mais se deveria inutilmente combater as secas com “soluções hídricas e grandes projetos de engenharia”. [1]

embora no imaginário nacional o semi-árido seja visto como uma região seca, tem uma pluviosidade de 750 bilhões de metros cúbicos por ano, dos quais apenas são aproveitados 30 bilhões, tem águas de subsolo e muita água estocada em açudes. [2]

a “seca do nordeste” é muito mais um problema social do que um problema da natureza.

Celso Furtado entendia que o projeto da transposição do rio São Francisco era "uma panacéia”, prioritariamente beneficiando os grandes proprietários de terras, que teriam "novos açudes para evaporar”, pois “o problema não está em ter mais água, mas em usar bem a água que já existe." [3]

o Nordeste tem mais de setenta mil açudes particulares de pequeno e médio portes, e mais de quatrocentos açudes públicos de médio e grande portes, com capacidade de armazenamento total de cerca de trinta bilhões de metros cúbicos, maior que a da barragem de Três Maria (cerca de 21 bilhões) e quase igual ao da grande barragem de Sobradinho (cerca de 34 bilhões). [4] trata-se do maior volume represado em regiões semi-áridas do mundo. [5]

a defesa do projeto da transposição se baseia nos seguintes pontos principais:

- a transposição é indispensável para resolver a situação de doze milhões de pessoas no Nordeste Setentrional;
- prevê retirar apenas 1% da vazão do São Francisco, sem prejudicar a utilização já existente;
- só haverá utilização maior de águas quando o nível do reservatório de Sobradinho estiver acima de 94%.
- o custo é muito baixo, pois evitará as despesas de quase todo ano no socorro a flagelados da seca;

nenhum destes pontos tem o menor embasamento técnico.

no Eixo Norte não há déficit hídrico para abastecimento da população. conforme o EIA/RIMA do empreendimento, 80% da água a ser transportada para esta região destina-se à irrigação e à criação de camarões. [6]

no Ceará, por exemplo, existe uma oferta hídrica potencial de 215 m³/s em suas bacias hidrográficas e uma demanda atual de 54 m³/s. no Rio Grande do Norte existe uma oferta potencial de 70 m³/s e uma demanda de 33 m³/s . na Paraíba, um dos estados mais problemáticos da região em termos de garantias hídricas, existe uma oferta potencial de 32 m³/s e uma demanda atual de 21 m³/s. não há escassez hídrica nos estados receptores, não se justificando, portanto, o ingresso das águas do rio São Francisco naqueles estados para fins de abastecimento. [7]

só os 2,4 bilhões de metros cúbicos do açude Açu seriam suficientes para abastecer a população do Rio Grande do Norte durante vinte anos – mas prevê-se abastecer o estado com águas transpostas do São Francisco. [8]

se a região receptora precisasse de água apenas para consumo humano, nem haveria a necessidade da transposição. o problema básico do semi-árido é a falta de confiabilidade de água para atividade produtiva, o que obriga a manter muita reserva técnica nos açudes, parte das quais acaba se evaporando. [9]

o acréscimo vindo da transposição não cobre nem a evaporação dos açudes. se os 2,10 bilhões fossem totalmente direcionados só para o açude do Castanhão (CE), apenas compensaria a evaporação deste mega açude que é, igualmente, de 2,10 bilhões de m³/ano. [10]

é um sofisma dizer que a transposição utilizará apenas 1% da água do São Francisco que chega ao Atlântico. a comparação honesta é relacionar o volume a ser captado com a vazão outorgável definida no âmbito do Plano de Recursos Hídricos. a vazão outorgável foi definida em 360 m³/s. este é o volume reservado para uso consuntivo em toda a bacia. [11]

dos 360 m³/s alocáveis na bacia, cerca de 335 m³/s já foram outorgados, restando apenas 25 m³/s - coincidentemente o que se pretende alocar como a nova justificativa do projeto de transposição. [12]

a demanda média do projeto será de 65 m³/s, podendo a vazão máxima atingir cerca de 127 m³/s, como restam apenas 25 m³/s outorgáveis, o rio já não dispõe, hoje, dos volumes necessários ao atendimento das demandas do projeto. [13]

mesmo com a regra de operação do projeto, de retirar uma vazão acima de 26m³/s somente quando o reservatório de Sobradinho estiver vertendo, isto é, quando tiver água “sobrando”, traz mais dúvidas do que certezas, porque os estudos comprovam que esta situação ocorre somente em 40% do tempo. em 10 anos só seriam retirados mais de 26 m³/s durante 4 anos. [14]

a represa de Sobradinho verteu em 1997 e voltou a verter em 2004. nesses sete anos, a bacia do rio passou por secas sucessivas, culminando, em 2001, com a mais séria crise energética da nossa história. [15]

o custo médio da água do projeto de transposição cobrado pelo uso da água bruta nos estados receptores será de R$ 0,1467/m³. este será o metro cúbico de água para irrigação dos mais caro do mundo, os projetos agrícolas ficarão inviáveis. [16]

segundo o EIA-Rima do projeto, a região potencialmente irrigável a ser beneficiada pela transposição é de 265.853 hectares. no Vale do São Francisco - segundo o Comitê de Bacias - existem 340 mil hectares irrigáveis e um potencial de mais 800 mil hectares, hoje não aproveitados justamente por falta de investimentos em valor muito inferior ao da transposição. [17]


as projeções do Ministério da Integração Nacional apontam como beneficiados pela transposição 9,075 milhões de habitantes. número que, pela evolução demográfica, deverá alcançar cerca de 12 milhões em 2025. a auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), com base em informações fornecidas pelos governos dos Estados "receptores" de águas do São Francisco (Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba), estima à população potencialmente beneficiada pelo projeto em 7,031 milhões de pessoas. [18]

conforme informa o Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, o Projeto de Transposição atende a menos de 20% da área do Semi-Árido e 44% da população que vive no meio rural continuará sem acesso a água. significa dizer que, de 5.712.160 habitantes (Censo IBGE 2001) da população rural dos quatro estados, apenas 3.198.809 habitantes é que serão beneficiados. [19]

portanto um número muito diferente daquele anunciado pelo projeto, que é de 9,075 milhões de pessoas. [20]

de acordo com a Embrapa, do total de precipitação pluviométrica caído anualmente no Nordeste, estimado em cerca de 700 bilhões de m³, 642 bilhões são consumidos pelo fenômeno da evapotranspiração. cerca de 36 bilhões são despejados no mar, em virtude do intenso escoamento superficial existente. e 22 bilhões de m³ são efetivamente pelos habitantes da região. bastaria o aproveitamento de 1/3 dos volumes escoados e manejados para o efetivo abastecimento de toda população nordestina (hoje estimada em 47 milhões de pessoas), com uma taxa de 200 litros por pessoa/dia e para a irrigação de cerca de 2 milhões de hectares, com uma taxa de 7.000 m³ por hectare/ano. [21]

numa só noite chuvosa, com precipitação de 70 mm num terço do Semi-Árido (300.000 km²) desabam sobre esta superfície exatamente 2,1 bilhões de m³ de água, o mesmo volume da transposição. [22]

o problema não está em ter mais água, mas em usar bem a água que já existe.

falta apenas uma grande e potente rede de adutoras para levar esta água a todos os recantos do semi-árido.70% dos açudes públicos não estão disponíveis para a população.

o custo atual da transposição, a maior obra do PAC, totaliza R$ 6,6 bilhões. esta verba não inclui os investimentos adicionais para levar a água para a população nas áreas laterais dos canais e para regiões mais dispersas do sertão, cujas despesas ocorrerão por conta dos governos estaduais. estima-se na verdade, que o custo final da obra chegue à R$ 20 bilhões. [23]

nos últimos anos, apesar da obra não ter saído do papel, a transposição do Rio São Francisco já custou aos cofres públicos, de acordo com o SIAFI, cerca de 466 milhões de reais. a maior parte do dinheiro foi paga ao consórcio Logos-Concremat, que venceu licitação para administrar o projeto, a começar pelas licenças ambientais. [24]



[1] Celso Furtado, “A Operação Nordeste”
[2] Marco Antônio Coelho, “A política governamental de obras contra as secas”
[3] Washington Novaes, “A transposição demolida antes de começar”
[4] Alberto Daker, em “Os descaminhos do São Francisco”, Marco Antônio Coelho
[5] João Suassuna, “Abastecimento no Nordeste: morrendo de sede no deserto com água no joelho.”
[6] José Carlos Carvalho, depoimento na Câmara dos Deputados
[7] João Suassuna, “Abastecimento no Nordeste: morrendo de sede no deserto com água no joelho.”
[8] Universidade Federal do Rio Grande do Norte
[9] Luis Nassif, “A transposição do São Francisco”
[10] Manoel Bomfim Ribeiro, “Ttransposição – uma análise cartesiana”
[11] José Carlos Carvalho, depoimento na Câmara dos Deputados
[12] João Abner Guimarães Jr., “O lobby da transposição”
[13] João Suassuna, “Transposição: projeto tecnicamente ruim, socialmente preocupante e politicamente desastroso.”
[14] José Carlos Carvalho, depoimento na Câmara dos Deputados
[15] João Suassuna, “Transposição: projeto tecnicamente ruim, socialmente preocupante e politicamente desastroso.”
[16] João Abner Guimarães Jr.
[17] Luis Nassif, “O Bird e a transposição”
[18] Alberto Daker
[19] Alberto Daker
[20] Alberto Daker
[21] Aldo Rebouças
[22] Manoel Bomfim Ribeiro, “Transposição – uma análise cartesiana”
[23] Alberto Daker
[24] Alberto Daker

12 dezembro 2007

Economistas: a chave do tesouro

economistas de mercado se distribuem em dois grandes grupos.

no primeiro estão os que fazem o marketing da política econômica neoliberal.

precisam adquirir currículo acadêmico em universidades norte-americanas. isto tanto os certifica como devidamente capacitados a servir os interesses do mercado, quanto confere respeitabilidade ao marketing, revestindo-o de "teoria e história da economia".

geralmente ocupam cargos ligados a análise macroeconômica, com grande visibilidade na mídia. e quase sempre não possuem a menor intimidade com o dia a dia das operações de mercado.

exemplo: Alexandre Schwartsman.

já os do segundo grupo não dão a mínima para o marketing, pois sabem que se trata apenas de jogo de interesses. preferem focar diretamente no cerne do negócio: rentabilidade.

decidem sobre o destino de centenas de bilhões de reais. são responsáveis por rolar aplicações de curtíssimo prazo. identificam oportunidades de arbitragem que se fecham em segundos. definem estratégia de investimentos baseada nos movimentos do mercado e não nos "fundamentos macroeconômicos". buscam a combinação certa de risco, prazo, rentabilidade, normas e instrumentos de gestão, para o que as "boas teorias econômicas" não passam de literatura ideológica.

embora tenham acesso franqueado a grande mídia, evitam o excesso de exposição. também não costumam se comprometer com a defesa fundamentalista do neoliberalismo.

exemplo: Armínio Fraga.

economistas do primeiro grupo até podem ocupar altos postos no mercado financeiro, como economistas-chefe ou diretores, mas não é comum lançarem-se a frente de empresas próprias (exceto consultorias), como acontece com os do segundo grupo.

para apoio a tomada de suas decisões de negócio, economistas do segundo grupo se valem de estudos técnicos, nos quais fica flagrante que, num cenário de queda de juros, o pré-fixado é excelente investimento, e não uma exatamente opção para "melhorar o perfil da dívida interna". [1]

entretanto, a manutenção da política econômica, que garante as rentabilidade obtida pelos economistas do segundo grupo em suas operações no mercado, necessita do marketing conduzido pelos economistas do primeiro grupo.


apesar disto, nas reuniões matinais realizadas pelos economistas do segundo grupo para traçar a estratégia das operações do dia, o marketing dos economistas do primeiro grupo não tem nenhum significado – nem mesmo como alguma poesia. [2]

tudo o que lhes importa é em quais mãos está segura a chave do Banco Central.






[1] vide Ricardo Summa, “Alongamento da dívida pública e pré fixados interessam aos rentistas”
[2] comentário do Economista no site Crítica Econômica, www.criticaeconomica.com.br

06 dezembro 2007

óbvio ululante

nada é mais cansativo do que tentar demonstrar o óbvio.
[1]

para Fabio Giambiagi, um dos “expurgados” do Ipea, o Brasil não cresce porque não merece. não passamos de um país com "mentalidade de funcionário público acomodado”.
[2]

talvez as correntes aprisionando nossa economia sejam mesmo as despesas com a previdência e os gastos sociais. e por causa da Constituição de 1988 nos tornamos cidadãos de mentalidade indolente, espírito acomodado e satisfeitos em depender do Estado.

também já houve época, no inicio do século XX, em que não podíamos crescer por causa do determinismo geográfico e racial. diziam que o desenvolvimento só era possível nos climas frios e por obra de grupos étnicos superiores.

talvez sejamos mesmo um povo de índole corrompida, sem caráter, padecendo no calor dos trópicos de triste sina, irremediavelmente inscrita pela mestiçagem em nossos genes, sem que jamais sejamos capazes de superar nossa preguiça e atraso ancestrais.

se assim for, como então conseguimos ser, até 1980, a economia mais dinâmica do mundo, dobrando o PIB cinco vezes seguidas em cinqüenta anos?

o descontrole do endividamento do Estado veio após o Plano Real (1994), com a dívida interna disparando de 7% do PIB em 1993, para 13% em 1994, até chegar aos 50% em 2006. apesar de sucessivos superávits primários, desde 1994, a taxa de juros reais se manteve a mais alta do mundo.
[3]

dissimulado sob a marca do Ipea, Giambiagi dedica-se em tempo integral a destruir o que restou da previdência pública brasileira. é também co-autor de um projeto de reforma previdenciária elaborado por encomenda de um conjunto de entidades do setor financeiro.
[4]

em 1989, quando Giambiagi estava em Caracas, como membro da equipe do BID que assessorava o governo de Andrés Pérez, a Venezuela foi sacudida por intensos protestos em reação a um pacote de medidas neoliberais inspirado pelo FMI .

iniciada em 27 de fevereiro daquele ano, a explosão social ficou conhecida como El Caracazo e sofreu repressão brutal. números oficiais admitem 300 vítimas. estima-se que entre 3.000 e 10.000 pessoas foram assassinadas.

referindo-se ao episódio, Giambiagi comenta da “perplexidade” que ele e seus colegas “sentiram na Venezuela vendo como as ruas reagiam diante daquilo que no resto do mundo pertencia ao terreno da obviedade”.
[5]

a quem serve Giambiagi? não é preciso ser profeta para se enxergar o óbvio ululante...
[6]



[1] Nélson Rodrigues, citado por Fabio Giambiagi, “Raízes do atraso - As dez vacas sagradas que acorrentam o país”
[2]
Fabio Giambiagi, Folha de São Paulo, 04/03/2007
[3]
arkx, “o que merecemos”
[4]
Henrique Júdice Magalhães , “A quem serve Giambiagi?”
[5]
Henrique Júdice Magalhães, “A Previdência e o Caracazo”
[6] Nélson Rodrigues: “Só os profetas enxergam o óbvio”