no já longínquo ano de 1993, mas ainda agora tão presente no impasse
atual brasileiro, o Escândalo dos Anões
do Orçamento é o gênesis do pacto de governabilidade expirado com o Golpeachment
e a queda da Nova República.
apesar de usarem cartões premiados da Loteria Federal para legalizar as
comissões recebidas, a sorte grande dos parlamentares envolvidos vinha mesmo é
do propinoduto das empreiteiras.
qualquer coincidência com o esquema mais tarde investigado pela Lava Jato & Associados é muito mais do que
mera semelhança.
Lula e o PT optaram
então pelo conchavo de cúpula, por julgarem ser inevitável sua vitória nas
eleições do ano seguinte (1994). esqueceram de combinar com FHC e o Plano
Real...
naquela época, como nos muitos casos subseqüentes, a casa trincou, mas
logo o Pacto à la Brasil se impôs para a salvação nacional das
oligarquias e dos poderosos caciques parlamentares.
algumas poucas cabeças foram decepadas, apenas para manter intacto o
organismo de um sistema político irremediavelmente contaminado.
apesar de por unanimidade ter sido enterrado em cova profunda, o Escândalo
dos Anões do Orçamento (1993) do fundo do túmulo logo se ergue, ganhando
novo corpo no Caso BANESTADO (1996/2002) .
da não apuração do qual, por sua vez, o reprimido retorna com a Operação
Satiagraha (2008).
e da supressão desta é gerada a Lava Jato (2014).
recheando também esta repugnante genealogia de conchavos de cúpula e
acordos de gabinete: o Mensalão (2005), a CPI
da Privataria (2011) e o Bolsolão (2018).
a cada vez que o sistema de poder é colocado a nu, logo as forças
políticas se reúnem para recobrí-lo com os mantos transparentes da hipocrisia, do
cinismo e da mais descarada cumplicidade.
a
anulação da Operação Satiagraha foi resultado de uma negociação
direta entre o governo Lula e Daniel Dantas, através da Editora Abril.
com
a divulgação do acordo em 09/2008, os Ministros Dilma Roussef e Tarso Genro
- este em nome e a pedido do próprio Presidente da República - se viram
compelidos a um desmentido: seria
mais fácil nascer dente em galinha.
já afastado do cargo
de Diretor-Geral da ABIN, em 29/12/2008 Paulo
Lacerda é definitivamente exonerado e indicado o posto de “adido policial”, na Embaixada
de Lisboa. logo se iniciaria também o calvário do
Delegado Protógenes Queiroz.
Tarso e Dilma foram
os arautos de uma das mais peculiares
realizações dos governos Lula: nos bicos das galinhas nasceram
dentes, para despedaçar com
voracidade o que restava de justiça no Brasil.
no Caso BANESTADO, estima-se que mais
de US$ 120 bilhões, oriundos da Privataria Tucana sob FHC, tenham sido
remetidos ao exterior através das contas CC5.
assim se formou um pérfida ciranda: ninguém larga o rabo de ninguém, porque todos tem um rabo imenso e o
rabo de cada qual está amarradinho no rabo dos demais.
de escândalo não apurado a escândalo não apurado, de fraude em fraude, de
estelionato eleitoral em estelionato eleitoral, de golpe em golpe, agora o véu
constituinte jaz definitivamente em farrapos.
Executivo, Legislativo, Judiciário estão despidos de qualquer poder
emanado do povo, alinhados a serviço de um único poder: o setor dominante.
enquanto o novo sistema de poder não se
estabiliza, as diversas facções em luta numa Guerra de Famiglias disputam entre si não apenas pela função de gestores executivos da
crise do Capitalismo no Brasil, como, principalmente, por uma necessidade de
sobrevivência.
caso lhe fosse possível, Bolsonaro não
hesitaria em dar o golpe dentro do golpe, decretando um novo AI-5 para
consolidar os Porões da Ditadura no
Palácio do Planalto.
caso lhes fosse possível, segmentos majoritários do setor
dominante defenestrariam o clã Bolsonaro. enquanto
não, seguem mantendo-o tutelado via chantagens, por conta de sua longa ficha
corrida miliciana, enquanto implementam o AI-5 digital.
para o centro do núcleo do setor dominante não
importa a preponderância de qualquer das facções em luta, desde que todas
operacionalizem o mesmo projeto neo-colonial e semi-escravagista, extirpando do
Brasil qualquer vestígio de soberania popular.
para ter um mínimo de legitimidade, e portanto
ser minimamente funcional, um novo sistema de poder exige um nível de
participação popular. exato o que o setor dominante brasileiro não mais admite.
sendo assim, o novo sistema de poder necessariamente tende a se configurar como
um Estado de Exceção.
se o poder que dá o golpe, não é o poder que consolida o golpe, desta
vez, ao se descascar camada por camada, nada restou no centro da cebola. um
vácuo que só pode ser preenchido de fora: o sistema perdeu completamente sua
capacidade de auto-regeneração.
uma institucionalidade em decomposição não pode ser
regenerada senão pelo próprio Poder
Instituinte. ou seja: o Poder Popular.
e Poder Popular não é criado
pelo voto, somente pela luta.
girando em falso em sua pérfida ciranda numa
encruzilhada fatal, a classe dominante engoliu o próprio rabo e jamais será parte
da solução para a crise. pois ela é a crise.
“De repente, surgiu ao longo do caminho uma luz
estranha, e eu me voltei para ver donde poderia ter saído uma claridade tão
insólita, pois atrás de mim só havia a mansão com suas sombras.
O resplendor vinha de uma lua no ocaso grande e cor
de sangue, que agora brilhava vivamente através daquela fenda antes apenas
perceptível, da qual eu disse que se estendia desde o telhado do edifício,
fazendo zigue-zague, até ao alicerce.
Enquanto eu a olhava, aquela fenda rapidamente se
alargou.
Sobreveio uma violenta rajada do turbilhão o inteiro
globo do satélite explodiu imediatamente à minha vista ...meu cérebro vacilou
quando vi as possantes paredes se desmoronarem... houve um longo e tumultuoso
estrondar, semelhante à voz de mil torrentes. . . e o pântano profundo e
lamacento, a meus pés, fechou-se, lúgubre e silentemente, sobre os destroços da
Casa de Usher".
“A Queda da
Casa de Usher”, Edgar Allan Poe
.
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