21 setembro 2008

ainda assim, se move

com a repercussão da divulgação de um acordo entre o governo Lula e Daniel Dantas, através da Editora Abril, para anular a Operação Satiagraha [1], os Ministros Dilma Roussef [2] e Tarso Genro [3] - este em nome e a pedido do próprio Presidente da República - se vêem compelidos a um desmentido: seria mais fácil nascer dente em galinha. [4]

entretanto, ao se considerar o atual nível de entrelaçamento de cumplicidades na política brasileira, nada parece ser verdadeiramente difícil.

em almoços e jantares, os que não se bicam e vivem se mordendo, acabam mastigando do mesmo cardápio.

na data da divulgação da notícia do acordo, a agenda de Gilmar Mendes apontava um almoço com a Diretoria da Revista Veja. [5] ainda naquela noite, num jantar fechado e discreto, o mesmo Gilmar Mendes seria homenageado por Lula, compartilhando à mesa, além do próprio Presidente e do anfitrião Antônio Toffoli, Advogado-Geral da União, estavam Dilma Rousseff, Tarso Genro, José Sarney e Gilberto Carvalho. [6]

data sinistra. noite confusa. patético momento... [7]

além de clara demonstração da existência de outros focos de pressão da opinião pública, capazes de contrabalançar ofensivas maciças da mídia convencional, [8] o impacto da divulgação do acordo provoca um curto-circuito no pensamento binário, até então paralisando o país num falso dilema entre campos opostos, mas complementares: a oposição conservadora anti-Lula e um apoio incondicional ao Presidente. [9]

capturada por uma esfinge sem enigmas, a política girava no vazio. e o projeto original de organização popular do PT fora reduzido a grupos de auto-ajuda, intitulados como “Amigos do Presidente Lula”. [10]

se a queda tardia no deserto do real impõe seu preço na forma de decepção e desencanto, também oferece a chance de um salto de maturidade política, desde que a inexpugnável popularidade de Lula se transforme em defesa inegociável daquilo que Lula simboliza: a ascensão das massas populares como protagonistas da política brasileira. [11]

longe de ser uma ação entre amigos, e menos ainda entre os amigos dos amigos, a política é um jogo complexo de pressões e contra-pressões, forçando a dinâmica correlação de forças a uma constante reavaliação.

o motor da política é a participação popular. sem ela, a política se esgota em si mesma, nas modernizações conservadoras, nas transições tuteladas, nas revoluções palacianas, nos pactos entre a elite e nos acordos de gabinete.

ao mesmo tempo, se expandem também as possibilidades da utilização da web como fator decisivo na política nacional, capaz de formar opinião e fomentar um debate mais amplo e profundo, influenciando decisões e arrancando respostas. [12]

aqui e agora, ainda assim, a política brasileira se move. mesmo sob o manto da hipocrisia, é obrigada a render alguma homenagem à virtude.



[1] blog do Luis Nassif, “Lula, Satiagraha e a Real Politik”, 16/09/2008, post às 8:00h
[2] blog do Luis Nassif, “Dilma explica”, 17/09/2008
[3] blog do Luis Nassif, “A Satiagraha e o Governo”, 17/09/2008
[4] blog do Luis Nassif, “Dilma explica”, 17/09/2008
[5] Agenda do presidente do STF para 16/09/2008, http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=96088
[6] Mônica Bergamo, Folha de So Paulo, 18/09/2008
[7] Cecília Meirelles
[8] blog do Luis Nassif, “A entrevista de Lula”, 18/09/2008
[9] arkx, “o pensamento binário”
[10] http://www.osamigosdopresidentelula.blogspot.com
[11] arkx, “bem vindos ao deserto do real”
[12] Eduardo Ramos, “A importância da internet na política”, Comunidade do blog do Luis Nassif

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