11 setembro 2008

por que somos tão fracos?

num Brasil já conformado a desanimar-se da virtude, rir-se da honra e envergonhar-se da honestidade [1], a operação Satiagraha nos encaminha a investigar firmemente a verdadeira questão: quanta verdade nós brasileiros ainda conseguimos suportar? [2]

à medida que nos grandes veículos de comunicação se ergue uma espiral de silêncio para tergiversar a pauta, desviar e ocultar o caso principal, [3] ainda assim, mesmo que nada se ouça, é possível sentir um grito infinito atravessando a paisagem. [4]

a desolação do cenário político brasileiro provoca indignação e desalento: “é melhor ser ladrão. não por ganância. mas por medo de ser confundido com gente honesta e acabar respondendo a processo." [5]

após publicamente ser chamado às falas [6] pelo Presidente do STF, Lula não se recusa a ceder dedos e anéis, mão, membros, tronco e cabeça. apesar de manter a coroa, cada vez mais se limita a presidir apenas o Bolsa Família. [7]

por que este governo é tão obtuso? é tão forte e parece ser tão fraco. [8]

com sua inexpugnável popularidade, o governo quer ser carregado nas costas pelo povo, mas não faz o menor esforço para se erguer. [9]

o que lhe falta? vitaminas? exercícios? leitura de bons livros? afastar-se da escuridão! [10]

qual seria este óbvio tão ululante que nem mesmo os profetas conseguem ver? [11]

se o PT nasceu como um partido eminentemente não parlamentar, focado no movimento social, apoiado nas bases, com um sólido conceito de democracia interna e voltado para a criação de um socialismo libertário, hoje restou apenas um quadro na parede. na casa de José Dirceu. um espantoso peixe cabeludo. assinado por José Sarney. [12] mas como dói...

numa longa e bem tortuosa trajetória de ascensão ao poder, as mais intensas e verdadeiras bandeiras petistas foram uma por uma largadas na poeira do caminho. converteram-se em caricaturais slogans para vender implante de dentes... [13]

todo partido marcado para desempenhar fins decisivos acaba por ser posto diante da hora da verdade [14], entretanto, a lealdade que guardamos com nossos princípios é muito mais do que uma proposta política. é um projeto de vida. é algo que ninguém cala. [15]

o governo é fraco porque tem o rabo preso. [16] muitos escândalos recentes foram claramente manipulados, mas é inegável, também, que integrantes do governo, alguns deles petistas, foram pegos lambuzados com a mão na botija. [17]

com uma política monetária menos ortodoxa, ampliando ações contra a corrupção e confrontando pontualmente, com estratégia e inteligência, a oposição conservadora e os veículos de comunicação golpistas [18], Lula não estaria acuado e o país inteiro na condição de refém.

entre o zero da servidão voluntária ao mercados e o infinito de um enfrentamento político suicida, há uma série de medidas cabíveis e alternativas razoáveis para se romper o estreito círculo de giz no qual gira no vazio a política brasileira, capturada por um curto-circuito, que ao mesmo tempo impede o retorno ao passado como voltar-se no rumo do futuro.

propostas para a economia existem. elas são mais do que sabidas. estão colocadas sobre as mesas de todas as autoridades. todo mundo sabe como resolver. o que falta é decisão: [19]

- controle de fluxo de capitais;

- queda dos juros até patamar correspondente a classificação de risco internacional do Brasil;

- reforma para terminar com a indexação dos títulos federais pela Selic, ou seja, fim da correção diária da dívida pública interna pela mesma taxa de juros que o Banco Central estabelece sobre as reservas bancárias para conduzir a política monetária;

- desindexação dos preços dos serviços públicos, e, mais amplamente, a proibição terminante de o governo brasileiro aceitar qualquer indexação em seus contratos e preços administrados;

- BC assumir como missão, além do controle da inflação, a manutenção do nível do emprego e do crescimento econômico.

no campo da política, a liga que forma consciências e cidadanias não passa necessariamente por governantes. passa pela ação popular. heroísmos praticado no anonimato, no sacrifício obscuro de quem sequer sabe de seu próprio heroísmo. [20]

nos primeiros anos de vida do PT, além da organização tradicional com Diretórios, conforme a legislação, existiam os Núcleos autônomos. eram considerados a pedra fundamental do partido. a base sobre a qual foi fundado e sobre a qual deveria se estruturar e se consolidar.

a via parlamentar era considerada como secundária e apenas como auxiliar para o campo onde se dariam as autênticas transformações da sociedade brasileira: a organização autônoma nos locais de moradia e trabalho.

pouco a pouco a via parlamentar foi se impondo. os Núcleos autônomos se tornaram um entrave para a elite dirigente, pois não podiam controlar e conduzir as bases.

de organismo vivo e a serviço dos movimentos sociais, o PT se reduziu a uma máquina burocrática para atender ambições pessoais. a militância petista desapareceu das ruas e se consolidou o modelo de campanha eleitoral financiado pelos grandes empresários e conduzido pelos marketeiros.

sem as formas de organização popular, ao se chegar ao poder, já não se tem mais poder algum...

durante a ditadura militar, participar de um simples fórum de discussão já assegurava enquadramento na LSN (Lei de Segurança Nacional). atualmente até mesmo parcelas consideráveis tanto da PF quanto da Justiça Federal e mesmo da Abin (ex SNI) e das Forças Armadas estão comprometidas com a Democracia Brasileira.

caso não se estabeleça em conjunto com todos os setores que apóiam a Democracia uma estratégia de enfrentamento, haverá o golpe. mesmo que seja um golpe branco. sem enfrentamento, adeus Democracia!

mas sem estratégia, adeus enfrentamento!

é preciso uma combinação certa de coragem, inteligência e competência para progressivamente superar divisões sociais sem acirrá-las a ponto do próprio processo de superação se inviabilizar.

mais do que nunca o Brasil se mantém aprisionados entre dois mundos: um definitivamente morto e outro que luta por vir à luz. [21] as raízes da crise atual residem no fundo do poço que separa o que já morreu do que ainda não conseguiu nascer. [22]

reina a sensação de que nada mais pode ser feito. só nos resta assistir passivamente a esse desfile interminável de vitórias do crime organizado. desabafamos apenas para não enlouquecer. é só isso. a democracia já era. sobrou o discurso. oco. [23]

a política e a ética estão condenadas a serem esferas conflitantes? [24]

haverá ainda muita frustração pela frente, muita sensação de impotência, muito ceticismo se o país conseguirá ser alçado à condição de Nação civilizada. mas a marcha da história é inevitável. é extraordinário o que estamos testemunhando nesses tempos de Satiagraha: é o parto de uma Nação. [25]

That's not the beginning of the end
That's the return to yourself
The return to innocence
[26]



[1] Rui Barbosa, ”De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto crescer as injustiças, de tanto ver o poder agigantarem-se nas mãos dos maus, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver a verdade vencida pela mentira, de tanto ver promessas não cumpridas, de tanto ver o POVO subjulgado e maltratado, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”
[2] Nietzsche, “Quanta verdade pode um espírito suportar?”, Ecce Homo
[3] Weden “A Espiral do Silêncio”, Comunidade do blog do Luis Nassif
[4] Edvard Munch sobre "O Grito"
[5] Hugo Albuquerque, blog do Azenha
[6] Gilmar Mendes, “Nesse caso, o próprio presidente da República é chamado às falas, ele precisa tomar providências.”, 31/08/2008
[7] Paulo Henrique Amorim, “GOLPE JÁ DEU CERTO: EISENHOWER NÃO MANDA NA CIA” 04/09/2008
[8] Luzete, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[9] Alexandre Carlos Aguiar, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[10] Justo, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[11] Nélson Rodrigues, “Só os profetas enxergam o óbvio.”
[12] Daniela Pinheiro, “O Consultor”, Revista Piauí
[13] Jair Alves, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif, “Outro dia tive o desprazer de ver um comercial de tevê usando a seguinte frase "sem medo de ser feliz" vendendo implante de dente.”
[14] Florestan Fernandes
[15] Alexandre Carlos Aguiar, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[16] Carlos, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[17] Fábio Alencar, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[18] Eduardo Ramos, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif, “O que eu penso que ele errou, foi ele errou, foi não ter confrontado a oposição e a mídia em situações pontuais, como esse caso agora, do grampo. E não ter ampliado ações contra a corrupção, além da totalmente desnecessária política monetária."
[19] Julio Sergio Gomes de Almeida, ex secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, demitido por ter criticado a política monetária do BC e seus efeitos sobre o câmbio, 04/04/2007
[20] Liu Sai Yam, comentário na Comunidade do blog do Luis Nassif
[21] Sérgio Buarque de Holanda, “Raízes do Brasil”
[22] Gramsci, citado por Chapeuzinho Vermelho, comentário no blog do Luis Nassif
[23] João Vergilio, comentário no blog do Luis Nassif
[24] Clever Mendes de Oliveira, comentário no blog do Luis Nassif
[25] Luis Nassif, “ O parto de uma nação”
[26] Enigma, “The return to innocence “

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