11 fevereiro 2020

Hy-Brazil: do momento Geisel ao momento Chávez


após o Marechal Castelo Branco ser nomeado pelo coronel dos EUA Vernon Walters como o primeiro ditador do MR-64 (Movimento Revolucionário de 31-MAR-1964), o Ministro do Planejamento Bob Fields (Roberto Campos) mergulhou o país numa política econômica recessiva e de submissão aos grandes interesses internacionais.

Castelo Branco (1964/1967) adotou um política econômica contracionista, marcada pela internacionalização, superexploração e concentração de renda, além de um submisso alinhamento automático aos EUA, a ponto de participar com 1.250 soldados da "pacificação" da República Dominicana, em 1965.

Golpe de 1964: abre-se um novo ciclo de acumulação capitalista no Brasil baseado na concentração, internacionalização e superexploração (Programa de Ação Econômica do Governo - PAEG).

Salário Mínimo: perda real de mais de 33% entre fevereiro de 1964 e março de 1968.

Concentração de Renda: 5% mais ricos aumentaram sua participação na renda nacional de 27,4% em 1960 para 36,3% em 1970.

Carga Tributária: 16% do PIB em 1963 para 23,8% em 1968.

Inflação: 25% em 1967 e 25,4% em 1968, bem acima dos 10% planejados e muito abaixo dos 79,3% em 1963.

PIB: abaixo dos 6% projetados, cresceu 3,4% em 1964, 2,4% em 1965, 6,7% em 1966, 4,2% em 1967, contra 8,5% a 10% durante o Plano de Metas de JK, 8,6% em 1961, 6,6% em 1962 e 0,6% em 1963.

Internacionalização: revogação dos artigos da Lei de Remessa de Lucros, que fixava um limite de 10% ao ano. empréstimos externos cresceram 65% entre 1964 e 1965, e os investimentos externos diretos triplicaram. abertura da exploração mineral a capitais privados e estrangeiros, com exceção do petróleo, do carvão e dos minérios ligados à área nuclear.


em 1968 explode a insatisfação popular com grandes manifestações de rua, assim como entre os blocos do setor dominante com a articulação do movimento da Frente Ampla de oposição.

o contra-ataque da Ditadura Civil-Militar vem em pinça por duas frentes: o AI-5 aprofunda o estado policial e a repressão, enquanto  aumenta a ênfase no crescimento econômico.

sintomaticamente o Plano de Desenvolvimento Econômico (1968) não faz referências a metas de inflação. o PIB cresce 9,8% em 1968, iniciando-se o Milagre Brasileiro.

se o bolo cresceu sem nunca chegar a ser dividido, antes mesmo do impacto do Choque do Petróleo (1973) a solidez do "Brasil Grande" já começara a se dissolver no ar com o Crash das Bolsas no Brasil e o fim do padrão monetário Dólar-Ouro, ambos ocorridos em 1971.

após a dissipação precoce das miragens do Milagre Brasileiro, o quarto ditador do MR-64 (Movimento Revolucionário de 31-MAR-1964) Ernesto Geisel lança o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento).

Geisel (1974/1979) pautou a política externa pelo "pragmatismo responsável", denunciou o tratado militar com os EUA, reatou relações diplomáticas com a China, reconheceu a independência de Angola, assinou acordo nuclear com a Alemanha, exonerou o comandante do II Exército por conta dos assassinatos de Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho, impediu o "auto-golpe" de seu Ministro do Exército, extinguiu o AI-5 e lançou o até hoje mais complexo e ambicioso plano nacional de desenvolvimento: o II PND.

“A verdade é que não estamos diante de uma simples crise, aguda embora, de reajustamento econômico em larga escala. Enfrentamos uma mudança estrutural de toda a economia mundial. O Brasil está conseguindo evitar a estagnação e a recessão.”
(véspera do Natal de 1975, em cadeia nacional de rádio e TV)

o ciclo de industrialização pesada do país se dá às custas de subsídios ao capital estrangeiro e endividamento externo: as raízes da  hiper-inflação, da faraônica dívida externa e do brutal aumento da desigualdade social.

o momento Geisel revela os limites para os Generais do MR-64 levarem a cabo mais uma modernização conservadora no Brasil.

a mágica keynesiana de Delfim Netto revelou-se inócua frente aos desdobramentos do fim do padrão monetário Dólar-Ouro (1971): o ingresso do Capitalismo numa crise estrutural até hoje não resolvida.


o momento Geisel choca-se com dois obstáculos, os quais foi incapaz, e muito menos se propôs, a transpor:

- o grande empresariado brasileiro, de modo geral, jamais será parceiro de um autêntico desenvolvimento nacional com inclusão social;

- nenhum desenvolvimento nacional se viabiliza sem o protagonismo da participação popular.

"No que se refere ao plano propriamente dito, o II PND cumpriu toda sua conturbada trajetória, como um produto de gabinete, incapaz de obter o apoio, e muito menos a mobilização de uma sociedade, que não participou de sua elaboração e não tinha como controlar sua execução.
[...]
O que fracassou foi a chamada "estratégia social", de acordo com a qual seria necessário "realizar políticas redistributivas enquanto o bolo cresce"."
Antonio Barros de Castro e Francisco Eduardo Pires de Souza

"O antiestatismo de nossos empresários liberais não consegue esconder suas prolongadas relações de dependência clientelista com o próprio Estado. Mas o estatismo de nossos desenvolvimentistas — dos conservadores mais do que dos progressistas — tampouco consegue justificar as alianças que comprometeram historicamente o Estado com a parafernália corporativa e cartorial e com o autoritarismo, sendo que o reformismo de nossos social-democratas não consegue jamais esclarecer como se faz a omelete da reforma do Estado sem quebrar os ovos que alimentaram os vários e heterogêneos segmentos pactados na base social de apoio á estratégia que modernizou nossa sociedade sem ampliar a cidadania social e política."
José Luis Fiori

com o atual estado de negação dos Generais frente ao inexorável desmoronamento do Imperium, se anuncia mais um fracasso das FFAA no exercício do governo federal.

como provável resultado, os Generais se defrontarão com o impensável: a eclosão no Brasil de um momento Chávez.

"Na Academia aprendi o que Napoleão chama de a 'flecha do tempo'. Quando um estrategista planeja uma batalha, deve pensar de antemão no 'momento histórico', portanto, na 'hora estratégica', depois no 'minuto tático' e, por fim, no 'segundo da vitória'. Nunca esqueci esse esquema de pensamento".
Hugo Chávez

poucos meses antes de ser eleito presidente pela primeira vez em 1998, Chávez deu uma entrevista defendendo uma política de "terceira via", "um modelo econômico humanista" como solução para se ter emprego, salário justo, seguridade social.

dez anos depois, em 2008, Chávez abandonara todas as suas ingênuas ilusões, principalmente após a "ação selvagem de sabotagem econômica e de terrorismo" do golpe de 2002, já se dera conta de que o "único caminho para sermos livres e independentes é o caminho do socialismo".

mesmo derrotado, o golpe de 2002 provocou uma queda de 27% no PIB no primeiro semestre de 2003.

para possibilitar a reversão da política anti-nacional praticada pela PDVSA desde 1975, foram demitidos 18 mil funcionários de um total de 42 mil.

conhecidas como misiones,  várias políticas sociais se viabilizaram com a decisiva participação do Exército, concretizando de maneira tangível a democracia participativa e protagônica

o "socialismo bolivariano do Séc. XXI" da constituição do Estado Comunal, como consolidação e articulação das diversas instâncias de poder popular: Conselhos Comunais, Comunas e Cidades Comunais.

em 2014 haviam mais de 48 mil Conselhos Comunais e mais de 2 mil Comunas.

Chávez teve perfeita clareza quanto ao caráter da burguesia venezuelana: 'Se eu tivesse feito um pacto com a Direita, eu já estaria politicamente acabado'.

em 17 pleitos eleitorais efetuados ao longo de 14 anos, o governo sofreu apenas uma única derrota.

{fonte: "A Revolução Venezuelana e o subdesenvolvimento com abundância de divisas", Fábio Luis Barbosa dos Santos}

não nos enganemos. tampouco eles mesmos se enganem.

os Generais estão tão perdidos em suas próprias bolhas de fake-news e pós-verdades quanto todos os demais: tanto quanto a Ex-querda, quanto eles, nós, tu, eu.

se não há vida inteligente dentro das bolhas, fora delas viceja barbárie e desintegração. e nada indica haver sinais de reversão desta descontrolada demolição destruindo o Brasil.

ainda assim, os Generais nunca antes neste país ganharam chance tão magnânima da História para enfim fazerem História.

mas como fazer História sob uma política econômica neoliberal gerida por Chicago's Oldies?

como fazer História sem arrancar o coração das trevas de uma lumpenburguesia que jamais será parceira de qualquer projeto de desenvolvimento nacional?

como fazer História sem colocar-se a serviço do protagonismo da participação popular?

os Generais estão diante de sua esfinge. não há como decifrá-la sem também a devorar. e não há como devorá-la sem devorarem a si mesmos.

do momento Geisel ao momento Chávez, passando pelo exasperante eterno retorno das ondas BolsoNazi, a marcha é sinuosa e espiralada, assolada por tragédias e desmoralizada por farsas, em rumo, quem sabe, a um temível e improvável, mas absolutamente indispensável e inexorável, momento Hy-Brazil.
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anteriormente em Hy-Brazil:

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