20/03/2018
foto: Ricardo Borges/Folhapress
Marielle tornou-se um símbolo. mas exatamente
do quê?
mulher, negra, favelada, LGBT, ativista pelos
Direitos Humanos e da causa das minorias. sim, sem dúvida!
mas devemos ir além. sempre é preciso ir além.
ultrapassar falsas fronteiras erguidas apenas para bloquear nossa compreensão
e, portanto, neutralizar nossa capacidade de ação.
além de tudo o mais, Marielle é fundamentalmente
um símbolo do genocídio da população de oprimidos e de sua luta por emancipação
e autonomia.
com seu brilho, seu carisma, com sua energia e
seus sorrisos transbordantes, por sua capacidade de re-existência, mesmo
após ser executada, Marielle é um símbolo daquilo que nunca fomos, mas sempre
aspiramos vir a ser: um outro Brasil, justo e fraterno.
"Como
descendentes de escravos e de senhores de escravos, todos nós, brasileiros,
somos carne da carne daqueles pretos e índios supliciados. Esta é a mais
terrível de nossas heranças. Mas nossa crescente indignação contra esta herança
maldita nos dará forças para conter os possessos e criar aqui, neste país, uma
sociedade solidária."
"O Povo Brasileiro", Darci Ribeiro
por que mataram? mas por que nos matam?!
porque não importa a cor de nossa pele, somos
todos nós brasileiros neguinhos bastardos, sem qualquer outro sobrenome
paterno, a não ser os hipócritas "dos Santos" e "de
Jesus".
fomos nascidos do estupro seguidamente
praticado por uma lumpenburguesia neo-colonial e semi-escravocrata contra todos
nossos ancestrais. de uma curra de séculos contra o Brasil, sua terra e sua
população.
esta Terra de Santa Cruz desde sua
invasão-descobrimento tem sido excomungada de suas riquezas. Pau-Brasil,
açúcar, ouro e diamantes, algodão, café, minério de ferro, soja, nióbio,
pré-sal. água, terras férteis e biodiversidade.
a cada uma dessas execuções, um novo ciclo do
Capital é financiado. a cada uma desses genocídios, muitos de nós são
assassinados. já não temos mais nenhum nome próprio, senão História do
Brasil...
mas não basta tão somente matar, é preciso
também destruir a reputação, forjar versões, espalhar calúnias, inventar
mentiras, sequestrar a imagem, apagar os registros históricos. silenciar por
completo os vencidos, para que nunca tenham sequer existido.
assim se reduz uma sucessão de revoltas a uma "história
sem sangue", heróicas
insurgências a uma passividade de "um povo que não se mexe". vidas
entregues à rebelde insubmissão são convertidas no "jeitinho
brasileiro". cada mártir da luta contra a opressão se transfigura num "herói
sem caráter".
quantas vezes e de quantas formas precisamos
morrer até assumirmos nossa própria História e nossa própria narrativa?
quem matou? mas quem nos mata?!
por que nos negamos a encarar a óbvia
realidade?
nenhuma pax
nos salvará. estamos no epicentro de uma Guerra Mundial Híbrida.
queiramos ou não, aceitemos ou não, já estamos de qualquer jeito num guerra de
extermínio. só nos cabe lutar por nossa sobrevivência.
por que insistimos em nos negar o nome de
nossos assassinos? se todos estamos mortos de saber quem são...
são os bancos! é o narcotráfico, que sem o sistema financeiro jamais
poderia legalizar seus lucros!
é o governo usurpador! são os mesmos desde sempre, aqueles que jamais
honraram com seus sobrenomes sua descendência negra!
é a "solução final" para erradicar a todos os goys!
é uma sociedade de castas, na qual alguns são os "eleitos"
enquanto os demais se tornaram obsoletos e descartáveis!
é o espectro da dominação total, de uma Nova Ordem Mundial que através
da estratégia da Guerra sem Fim já não pode mais dissimular sua palavra
de ordem: viva la muerte!
quem morreu? mas quem morreu?!
olhai para aqueles caixões. estão fechados. mas não é preciso se
abrirem as tampas. dentro deles estão nossas ilusões.
chegou a hora de dizer adeus não apenas a elas, mas a nós mesmos.
a morte de Marielle a isto simboliza: nossa ressurreição.
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