ciclos
Lula está no auge do poder político, mas o que Lula faz do auge do seu poder? [1]
é bem verdade que há um certo regozijo por parte da elite com a possibilidade de o Brasil inaugurar um novo ciclo da cana-de-açúcar. [2]
proclamados como heróis por Lula, usineiros do álcool não se esquivam em reconhecer a especial atenção que lhes dedica o Presidente: “Ele é muito amigo nosso. Somos muito gratos a ele. Ele nos defende...” [3]
até o mega-herói internacional George Soros não restringe os elogios: "Lula foi muito precavido ao tornar-se um fiador do mercado financeiro". [4]
porém, mesmo com o Brasil se transformando num imenso canavial, nenhum país que concentrou na cana-de-açúcar sua fonte de riqueza foi capaz de prosperar. [5]
Pedro Ramos, pesquisador da Unicamp, afirma que muitos dos cortadores de cana “são trabalhadores em um regime de escravidão disfarçada”. nos anos 80, um trabalhador cortava quatro toneladas e ganhava o equivalente a R$ 9,09 por dia. hoje, corta na média 15 toneladas e ganha cerca de R$ 6,88 por dia. [6]
o esgotamento dos trabalhadores deve-se ao constante aumento das metas de produção, a novas técnicas de cultivo que buscam mais produtividade e a variedades de cana com mais sacarose, embora menos pesada. se antes 100 metros (quadrados) de cana somavam 10 toneladas, hoje são necessários 300 metros.
nunca um Presidente se elegeu com tanta autonomia para ditar os rumos de seu governo. o quebra-cabeça político do segundo mandato foi montado por inteiro, e com exclusividade, na mente de Lula. [7]
mas o que Lula fez no auge do seu poder?
Lula formou uma ampla coalizão política "pensando nos próximos 20 anos” [8] e reunindo quem nas últimas décadas sempre esteve no poder. contundente exemplo, seu novo Ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, também serviu ao regime militar e aos governos Collor e FHC. [9]
enquanto desfruta de seu poder para a instauração de um hipotético consenso abrangente e duradouro [10], Lula mantém blindada a política econômica, com juros e câmbio aprofundando o desemprego e a desindustrialização.
de 2002 a 2006 a produção industrial ostentou índices de crescimento ínfimos , o crescimento do emprego patinou, oscilando pouco acima e pouco abaixo de zero e as importações aumentaram 27,4% em 2004, 17,6% em 2005 e 23.4% em 2006. [11]
a exuberância dos sucessivos ciclos da história econômica do Brasil nunca foi suficiente para desenvolver o país, sempre caracterizado por desigualdades profundas, relacionadas com a superexploração da mão-de-obra e a transferência de riquezas para o exterior.
nosso desenvolvimento truncado, além de desigual, é combinado. o “moderno” (a industrialização/urbanização) e o “atrasado” (a estrutura agrária/rural) na economia brasileira não somente se integram, como são condição necessária para o elevado elevado nível
da taxa de acumulação e da exploração da força de trabalho. [12]
as últimas eleições presidenciais também foram marcadas por ciclos. tudo indicava uma tranqüila e insossa reeleição de Lula ainda no primeiro turno. o tiro no pé do dossiegate provoca o adiamento de uma vitória anunciada. [13] quando parecia que a política se tornara definitivamente irrelevante e os Mercados já festejavam pacificados, pouco importando quem vencesse, o segundo turno politiza a campanha e a pauta das eleições se altera. [14]
a própria personalidade do Presidente parece sujeita a ciclos, oscilando conforme a conjuntura política lhe favorece, ou não.
no auge de seu poder, Lula se esforça na vã tentativa de perenizar um momento. não tem pressa. [15] está no auge de seu poder. porém, ciclos se esgotam e outros se aproximam. o prazo de validade da lua-de-mel de Lula com a opinião pública está perto de vencer...
[1] Vinicius Torres Freire, "Lula na inércia da história do Brasil", 25/03/2007
[2] Marcio Pochmann, "O silêncio dos cemitérios"
[3] Rubens Ometto, dono do grupo Cosan e de uma fortuna de US$ 2 bilhões, oitavo brasileiro mais rico e 488º do mundo, "o primeiro bilionário mundial do álcool", segundo a "Forbes", 26/03/2007
[4] George Soros (dono da Adeco e investidor de US$ 900 milhões na construção de usinas de cana-de-açúcar no Mato Grosso do Sul e Minas Gerais), em 23/03/2007
[5] Geraldo Majella, presidente da CNBB, 22/03/2007
[6] Luiz Felipe de Alencastro, sequenciasparisienses.blogspot.com
[7] arkx, “Lula II: o Homem-Presidência”
[8] Lula, 23/03/2007
[9] Clóvis Rossi, “20 anos não é nada”, 24/03/2007
[10] Roberto Mangabeira Unger, “Crescer sem dogma”, Folha de São Paulo, 13/03/2007
[11] Luis Nassif, “A desindustrialização em marcha”, 23/03/2007, luisnassif.blig.ig.com.br
[12] Francisco de Oliveira, “Crítica à razão dualista”
[13] arkx, “o adiamento de um vitória anunciada”, 14/09/2006
[14] arkx, “a terceira via”, 18/10/2006
[15] Lula, 13/03/2007
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