02 fevereiro 2017

a verdade por inteiro

02/02/2017



desde o choque de realidade causado por aquela farsa dantesca encenada no teatro de horrores da Câmara, ainda era esta a frase ecoando em meio ao desastre e o caos.

como uma profética maldição, uma conspiração de circunstâncias negativas, para manter o país aprisionado numa era de Aquarius ao inverso.

como aquele interminável pesadelo tivera início? alguém ainda se lembrava?

após meses de incessante tortura psicológica, as mentes estavam atordoadas e confusas, dominadas pela frustração, raiva, impotência e depressão. ainda prevaleciam os sintomas mórbidos, os fenômenos bizarros e as criaturas monstruosas.

houvera um luminoso interregno, o tempo de uma sólida ilusão que o futuro enfim acabara de chegar. o milagre realizando-se para os trabalhadores brasileiros enfim entrarem no paraíso.

mas isto verdadeiramente estivera a ponto de acontecer? ou fora tão somente fake news, num ainda então não reconhecido reino da pós-verdade?

quando exatamente se desencadeou aquela maldita psi op? antes ou depois das bolhas começarem a estourar? desde quando aquele jogo era bancado pelas “trapaças da sorte”?

em que momento se atravessara a superfície do espelho, transformando a realidade num invertido reflexo infinito de miragens? quando se mergulhara naquele pavoroso abismo que parecia não ter mais fim?


apanhado numa armadilha do destino, o anjo da História se debate. com seu rosto voltado para o passado é impelido de costas para o futuro. tudo o que pode ver são ruínas se amontoando em direção ao céu.

2016 não tinha fim e 2018 continuará um ano longe demais. tudo se repetia, se repetia, repetia, repetia... como um dia que iria durar para sempre, com o Brasil preso num movimento em falso. o tempo circular do karma instantâneo. não há retorno, nem qualquer futuro para onde se fugir.

numa realidade liquefeita, a sociedade experimenta a História enquanto torturante acontecimento do agora. a intensidade do momento leva os indivíduos a delirarem o campo social. os surtos se tornam endêmicos. os delírios se propagam. tudo entra em colapso. um mundo surreal. uma sociedade hiper-normalizada.

quantas pessoas conseguem suportar a incerteza e perplexidade de um momento histórico enquanto ele se desenrola?

a verdade revelada por inteiro: todas as encenações eram verdadeiras. sim, é possível contar uma grande mentira dizendo só a verdade! com as máscaras caídas ao chão, só cabia aos personagens sua busca vã por algum autor.

após todas as bolhas desaparecerem, já não restara pedra sobre pedra. enfim, numa crise de pânico, todos se dão conta que ninguém mais sabia como sair daquele impasse. a crise se tornara maior do que tudo e maior do que todos.

todos os velhos personagens do grande inverno de nossas almas eram tragados pelas chamas por eles mesmos acesas. o verão é agora. Dracarys.

haveria algum transmutador histórico? algo capaz de destravar o karma instantâneo. não para restaurar o movimento linear do tempo pendular e mecânico do relógio capitalista. mas para fazer irromper um tempo qualitativo e catalisador no presente de todos os momentos de revoltas no passado.

haveria um tempo no qual atos individuais se potencializam e ganham efeito social? um tempo prenhe das possibilidades de um futuro indeterminado. como dar um salto sob um Sol imóvel no meio de seu curso? um salto para o passado e imediatamente de volta para o futuro, libertando o presente de sua agonia e desespero infindáveis.

só há um único movimento capaz de construir a nova identidade: mergulhar no abismo e atravessar a superfície do espelho. então era isso!

ser louco não é necessariamente ser doente. a loucura é um produto de uma destruição imposta e auto assumida. uma loucura é um grosseiro disfarce, uma caricatura grotesca do que poderia ser a cura natural. a autêntica saúde mental implica, seja de que modo for, a dissolução do ego denominado de “normal”...

“e começou a decifrar o instante que estava vivendo, decifrando-o à medida que o vivia, profetizando-se a si mesmo no ato de decifrar a última página dos pergaminhos, como se estivesse vendo a si mesmo num espelho falado.”
“Cem Anos de Solidão” – Gabriel Garcia Marquez
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