09 fevereiro 2017

os Brasis: a Ex-querda e a re-existência

09/02/2017


o Brasil fora estilhaçado. como pedaços de espelhos partidos, os vários Brasis já não refletiam nenhuma identidade coletiva.

assim como a teoria e a interpretação majoritárias sobre o Brasil haviam sido volatizadas pelo golpeachment, os tradicionais conceitos e práticas da Esquerda se revelaram como apenas mitologias e equívocos.

junto com o Brasil também estava morta a Ex-querda.

a Ex-querda é uma ampla frente de partidos, organizações, associações, tendências e diversos tipos de grupos. todos reunidos sob a incontestável liderança do Lulismo.

ainda mais definidor que sua organicidade, a Ex-querda é um modo de se pensar o Brasil e de como encaminhar a luta política.

foram pensadores da Ex-querda os principais responsáveis pela arquitetura teórica de um Brasil mitológico, conveniente a uma tradição liberal conservadora; foram também políticos da Ex-querda os que por aquela teoria balizaram na prática o movimento popular, fazendo dele uma conveniente forma de gestão do capital.

a Ex-querda é o Brasis contraface ao Brasis dominante. verso e reverso de um mesmo modelo. São Paulo Ltda. tem sua outra face no PT quatrocentão. a Lava Jato & Associados tem sua correspondência no Republicanismo companheiro.

ainda mais irônico e surpreendente é a constatação de boa parte dos integrantes da Ex-querda serem habitantes do Brasis BrasiNazi. com seu sectarismo, seu dogmatismo, seu centralismo, seu autoritarismo, seu culto a personalidade e sua abominação ao contraditório, a Ex-querda apenas deseja substituir uma estrutura de poder por outra, tão perversa quanto.

em seus 13 anos na gestão de BrasilPar, a Ex-querda jamais se poupou de louvar seu desempenho no bem cuidar dos interesses da Tirania Financeira Global: “Nunca os bancos ganharam tanto dinheiro".

a Ex-querda nutria enorme ressentimento pela MídiaGlobal, apesar de suas doações bilionárias, sob a rubrica de patrocínios e publicidade, jamais conseguira cooptá-la inteiramente.

após sua destituição pelo golpeachment, a Ex-querda continua perdida, perambulando em seu labirinto. dele jamais chegará a sair sem desvencilhar-se de suas correntes, como invertidos fios de Ariadne, mantendo-a atada ao centro da armadilha: o Minotauro do Lulismo.

agora, sua única plataforma se restringe a mirar num ano para sempre longe demais: 2018. sua única bandeira se limita a uma única candidatura.

sua obsessão com um futuro inalcançável só era comparável à compulsão em retornar ao passado no paraíso do big-bang das commodities.

sua única e perpétua liderança é Lula. “Lula 2018” ou ”Lula Já”. sempre Lula!

mas nunca Lula nas ruas e nas ocupações liderando uma resistência popular contra o governo ilegítimo. nunca Lula explicitamente defendendo a anulação do impeachment, a punição dos responsáveis pelo golpe e a revogação de todos os atos e contratos do governo usurpador.

a insistência em anunciar Lula como o “grande líder Salvador da Pátria”, apenas revelava repetidamente como ele já não possuía o vigor físico necessário, tampouco nunca tivera o perfil político, para conduzir uma guerra pela libertação do Brasil. ainda pior, deixava claro que tipo de “salvação do Brasil” se pretendia obter.

como artifício para justificar sua própria capitulação, a Ex-querda transfere sua omissão para os fantasmas que forjou: “esse povo não vai prá rua!”, “esse povo de frouxos!” e “esse povo que não sabe votar!”.

sempre “esse povo”, e nunca ela mesma...

desde o início do processo de impeachment, relevante parcela da população jamais saíra das ruas e das ocupações, participando ativamente de centenas de atos, protestos, manifestações e passeatas.

quem das ruas se ausentara e se empenhara em delas afastar o povo foi a própria Ex-querda.

não havia também qualquer fundamento histórico na acusação de sempre termos sido “um povo de frouxos”. a História do Brasil é escrita com o sangue dos massacres dos levantes populares.

quem nunca demonstrara a combatividade necessária para enfrentar o golpe era a Ex-querda, sempre se ofertando em súplicas pelo último acordo.

se o Congresso Nacional fora usurpado por uma horda fisiológica, isto não ocorrera legitimado pelo voto popular. e sim através da promíscua coalizão do quociente partidário com o financiamento empresarial. dos 513 deputados federais, só 36 foram eleitos unicamente com votos próprios.

ao contrário, “esse povo” elegera por quatro vezes Presidentes da Ex-querda comprometidos com a reforma política, sem que estes jamais tratassem, na prática, esta questão como vital para a manutenção da Democracia brasileira.

se “esse povo” não sai às ruas, é alienado. se sai, seus protestos pacíficos são reprimidos com violência. se não reage, é frouxo. se reage, é vândalo, baderneiro, apenas fornecendo munição para justificar ainda mais repressão.

esta linha de raciocínio só serve aos impotentes, aos derrotados de véspera, aos que nunca quiseram se contrapor, aos que ainda imploram pelo acordo, pelo conchavo, pela conciliação impossível.

quanto mais a Ex-querda insistia na tentativa de trazer seus mortos à vida, mas ela confirmava sua própria morte.

“trazer os mortos à vida
não é nenhuma grande mágica.
poucos estão completamente mortos:
sopre as brasas de um homem morto
e uma chama viva se levantará.

então conceda-lhe a vida, mas considere
que o túmulo que o abrigou
agora não pode ficar vazio:
você com suas roupas manchadas
nele você deve se aconchegar deitado.”
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