10/07/2017
o golpe de 2016 é
a regra. o Golpeachment não é uma exceção, e sim apenas mais um
evento numa ancestral guerra civil,
na qual a cleptocracia brasileira se impõe contra todos os demais. se o
impeachment de Dilma teve como objetivo aplicar plenamente as “medidas impopulares” derrotadas por
quatro vezes nas urnas, o golpe
brasileiro é um processo. jamais será derrotado pela via parlamentar e
institucional. ao contrário, o golpe desmascara os poderes constituídos como
sem qualquer legitimidade. só um amplo movimento de massas é capaz de se
sobrepor ao golpe. assim como o golpe, este próprio movimento de massas é
também um processo. ao Estado de Exceção permanente deve-se opor um incessante
movimento de insurreição.
nenhuma pax nos
salvará. num mundo tomado por uma grande guerra global híbrida e assimétrica, a
linha de frente de batalha está em todos os lugares, sem que nenhum desses
lugares seja a linha de frente principal. o front em cada um, e mais
ninguém em cada front. mais do que
conquistar territórios e se apossar de recursos naturais, a guerra
contemporânea objetiva o controle das populações. submeter seus corações e
mentes ao ponto de desejarem a submissão. não haverá retorno aos keynesianos anos
dourados do capitalismo fordista no pós II Guerra Mundial. ao mesmo tempo que
precariza estruturalmente o emprego, o capitalismo cognitivo expande o tempo de
trabalho para colonizar todo o tempo de vida. jamais se deixa de trabalhar na produção
de valor imaterial.
a Esquerda
brasileira tradicional está obsoleta. prisioneira de paradigmas vencidos, a
Esquerda brasileira, em sua quase totalidade, não consegue agir, sequer pensar,
minimamente conectada com as novas condições contemporâneas. a Esquerda
institucional jaz inerte, sempre pautada pelo calendário eleitoral, operando
pela via parlamentar e orientada a pesquisas de popularidade e intenção de
voto. oportunismo, fisiologismo e caudilhismo se mesclam numa fórmula de nunca
ousar qualquer mudança, tão somente elaborar argumentos para justificar seu
imobilismo. por outro lado, a arcaica Esquerda stalinista jamais se livrará de
seus vícios de nascença: sectarismo, dogmatismo, centralismo, autoritarismo e
culto a personalidade.
uma nova Esquerda
só pode nascer de um novo modo de vida. se todo o tempo de vida se tornou tempo de
trabalho, e se a guerra se processa no tecido das relações sociais e através da
governança das subjetividades, nenhuma militância política pode estar separada
do modo mesmo de se viver. o inimigo está em toda parte. onipresente, polimorfo
e multifacetado, o inimigo somos nós. definitivamente, todos os Muros de Berlim
vieram ao chão. já não há nenhuma fronteira nítida dividindo blocos claramente
distintos. num mundo em que a vida se tornou o teatro de operações da guerra
civil sem fim, é no modo de se viver que são travadas todas as batalhas.
a Ex-querda e o Lulismo fazem parte do golpe. Dilma não foi derrubada por se opor a adotar
as “medidas impopulares”. logo após sua
reeleição em 2014, Dilma lançou o Plano Levy, encaminhou as reformas da
previdência e trabalhista, assim como também ampliou o programa de
privatizações, e não apenas sob o modelo de novas concessões, como no caso da
BR Distribuidora e do pré-sal. o golpe foi uma exigência natural do esgotamento
da estratégia de conciliação permanente do Lulismo, o que a Direita soube muito
bem compreender, mas a Ex-querda até agora não quis assimilar. Dilma foi
derrubada porque a cleptocracia brasileira, e seus sócios majoritários globais,
não aceitaram senão uma completa rendição incondicional do Lulismo. nenhum versão mitigada das “medidas impopulares”, apenas sua brutal
e rápida implementação. do mesmo modo, não será pela versão
"mitigada" de oposição ao Golpeachment
que ele será superado. como o golpe só pode ser derrotado por um incessante
movimento de massas, algo absolutamente fora de questão para a Ex-querda e o Lulismo, ambos são na prática sustentadores passivos do golpe.
as novas formas
de organização nascerão das lutas. não é “o povo” que produz a luta e a resistência, é a luta e a resistência
que forjam o seu Povo. do mesmo modo,
as novas formas de organização não são preexistentes e serão geradas pela luta
e pela resistência. quem muda o mundo
são as pessoas, e o que muda as pessoas são as experiências de vida
compartilhadas na luta para mudar o mundo. numa economia fundamentalmente
terciária, onde tudo são serviços e mesmo a produção de commodities está
determinada pela logística, já não pode haver qualquer centralidade de uma
mítica "classe operária", cada vez mais deslocada para os gulags industriais chineses. a classe deve ser procurada onde há luta. ali a classe vive
e se reinventa. não há e nunca houve nenhuma "nova classe média", esta fantasia conceitual tão
conveniente tanto aos economistas neoliberais quanto aos teóricos do Lulismo. no Brasil como no mundo, a
única novidade para as classes médias é seu inexorável empobrecimento. não está
em curso nenhuma mobilidade social através da qual os pobres estão se tornando
classe média, e sim o tornar-se pobre
das classes médias. é ao se levantar para lutar como Multidão, como em Junho de 2013 e agora na resistência ao golpe e suas
contra-reformas, que a classe se constitui. esta ascensão selvagem da classe
sem nome não admite nenhuma homogeneização de suas irredutíveis diferenças,
ficando como única característica comum serem todos pobres sem perspectiva de futuro. a fábrica onde habitam são os
grandes centros metropolitanos. sua única chance de sobreviver é criar um outro
modo de viver.
o golpe não se
estabilizará. o golpe de 2016 tem seu marco zero quando Dilma lançou o Plano Levy, antes
mesmo do início de seu segundo mandato, traindo seus eleitores que rechaçaram
nas urnas tal proposta. assim como então foi inútil tentar reverter uma crise
econômica aplicando as mesmas medidas que a produziram, nenhuma das
contra-reformas neoliberais será capaz disto. ao contrário, apenas aprofundarão
a estagnação econômica, o caos social e
a instabilidade política. a plutocracia brasileira jamais poderá apresentar
qualquer solução viável para a crise, pois ela é a causa da crise. em situações
limites tudo e todos se revelam como de fato são. para um golpe imposto pela
exigência de se impor por cima de qualquer legitimidade popular as “medidas impopulares”, não deixa de ser
irônico ter criado um impasse frente ao qual a única forma de superação seja
justamente através das "medidas
populares". ou seja: a nulidade do impeachment e o grande capital pagar
o pato de uma crise por ele desencadeada.
um novo modo de
viver se processa pelas lutas no cotidiano. não haverá nenhuma solução para a atual
crise brasileira vinda de cima para baixo. nenhum Salvador da Pátria, nenhum Pai
dos Pobres, nenhum Pacto à la Brasil. a crise de representação é irreversível.
nunca antes neste país foi tão grande a fratura entre os poderes constituídos,
com suas instituições, e o poder instituinte da soberania popular. esta fratura
tende a se acentuar, desembocando num regime autoritário, mas que tampouco
conseguirá estabilizar o golpe, por nada mais ser do que um outro golpe na
sucessão de golpes dentro do golpe. não há mais qualquer possibilidade de saída
para a crise brasileira atual. apenas a construção de um portal de entrada para
um novo ciclo. esta construção só se concretiza por meio de lutas localizadas
integradas num amplo movimento de massas em âmbito nacional. com a periferia se
tornando o centro, o interior a capital, a membrana o núcleo, a pele como a
mais profunda carne. é no processo de suas lutas concretas por pautas concretas
que pessoas concretas experimentam o Poder
da Comunidade. chegando então a compreender como o local e o global são
apenas duas perspectivas de uma mesma luta: viver uma vida que valha a pena ser
vivida.
nosso inimigo tem
muitas faces. nos espreita em todos os lugares. nos ataca o tempo todo. mas agora
temos uma vantagem. todas as máscaras caíram. já não temos como nos enganar.
nem mesmo quando nos olhamos no espelho. ou lutamos, ou não sobreviveremos.
vídeo: Welcome to Hell - G20 Hamburg
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