01 julho 2017

os Brasis: fazer-se musgo, tornar-se Multidão

01/07/2017


as briófitas são vegetais muito antigos, os primeiros a evoluírem no ambiente terrestre, há cerca de 420 milhões de anos. são minúsculas e vivem em colônias. além de indicadores de saúde ambiental, em eco-sistemas degradados são as espécies pioneiras no processo de sucessão ecológica para regeneração daquele meio ambiente.

líquens e musgos são exemplo de briófitas. reduzem a erosão, servem como reservatório de água e nutrientes, fornecem abrigo à micro-fauna e funcionam como viveiros para outros vegetais.

apesar de seu diminuto tamanho e de aparentemente terem irrelevante importância, exercem um papel capital no eco-sistema, o que só é possível por viverem em colônias. sua potência não reside em cada espécime isolada, mas em seu poder coletivo.

vivemos nos Brasis o momento perene do Capitalismo de Crise. incapaz de se auto regenerar e submetido a crises periódicas cada vez mais destrutivas, o Capitalismo incorporou a crise como um modo de governar. as medidas tomadas para superar a “crise” não servem para combatê-la. ao contrário, a “crise” é desencadeada como pretexto para aplicar tais medidas.

portanto, não há nenhuma saída para a crise do Golpeachment que não se fundamente sobre sua nulidade.

o eco-sistema social está degradado, os poderes constituídos perderam sua legitimidade, as instituições faliram e a representação morreu. a única saída para deste deserto é um portal de entrada: iniciar um processo de regeneração no qual a espécie pioneira há de ser Multidão.

numa economia terciária, onde tudo e todos são rede de fornecedores de serviços, com o tempo de vida convertido plenamente em tempo de trabalho não remunerado, um incessante trabalho imaterial e desvinculado do emprego e do salário, agrega valor ao produto através de sua associação com um modo de viver.

a mesma camiseta de malha, idêntica materialmente, tem valor absurdamente diferente caso esteja associada a uma grife. ao usá-la, se faz do corpo um comercial vivo. se está trabalhando gratuitamente para agregar valor a esta grife, mas se experimenta como de fato vivendo o modo de vida associado aquela grife. então nos tornamos apenas escravos felizes com a própria escravidão. mas tanta “felicidade” ilusória só pode redundar em depressão, o distúrbio psico-somático de nossa época.

ao colonizar o tempo de vida, o biopoder expropria nossa energia vital. aos poucos, nos tornamos zumbis num ambiente de anomia. ao biopoder devemos afirmar a biopotência: uma indomável vontade de viver. o cuidado de si, para neutralizar o processo de zumbificação. mas isto só pode ser feito coletivamente, numa sucessão de regeneração do eco-sistema social.

com o Golpeachment todas as máscaras caíram. em situações limites, tudo e todos se revelam como são.

uma cleptocracia colonial e escravagista jamais deixará de ser atavicamente golpista. não é sustentável nenhuma estratégia de conciliação de classes. todo pacto é apenas uma traição adiada.

nenhum neo-desenvolvimentismo terá êxito, a não ser abandonando a própria noção de “desenvolvimento”.

os recursos naturais limitados impõe limites definitivos a uma expansão ilimitada das forças produtivas. do mesmo modo, um meio-ambiente ecologicamente equilibrado só se sustenta numa sociedade onde haja justiça social. nenhuma inclusão social é autêntica quando baseada no consumo. qualquer projeto econômico deve se erguer além da dicotomia natureza/cultura.

o processo de reconstrução da Democracia e da refundação da República, não se dará sob a luz dos velhos modelos. tudo terá que ser reconstruído de baixo para cima, de dentro para fora, sob o paradigma da transversalidade: uma verticalidade profundamente enraizada num ampla e capilarizada horizontalidade.

para a sobrevivência dos Brasis, tudo deverá ser reinventado, a partir de nos mesmos, de nosso modo de viver. a regeneração de nosso eco-sistema social, econômico e político começa com nosso poder de fazer-se musgo e tornar-se Multidão.

vídeo: Fazer-se musgo

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