sem que tenha havido um conhecimento prévio ou nenhuma visão estratégica por parte do governo, uma nova situação altera a dinâmica da economia brasileira. o acúmulo de dólares em nossa balança de pagamentos, criada pela colossal demanda chinesa por matérias-primas, provoca a mudança de sinal em nossas contas externas. [1]
analistas com fortes conexões com o mercado financeiro, muito embora acertem no diagnóstico, falham na conclusão sobre os motivos da apreciação da moeda brasileira, colocando-a como reflexo natural da mudança estrutural da balança de pagamentos e da desvalorização mundial do dólar.
os dados entre 2003 e 2006 indicam que a valorização cambial não pode ser exclusivamente creditada às contas externas. a grande maioria das principais economias emergentes teve um saldo em conta corrente como porcentagem do PIB mais elevado que o Brasil, apresentando uma valorização cambial menor. [2]
ao se relacionar saldo em conta corrente e os juros reais em várias economias, a curva resultante indica que quanto melhor o resultado nas contas externas do país, menores os juros reais verificados. no gráfico se destaca apenas um ponto muito fora da curva: o Brasil. esta distorção abre excelente oportunidade para o mundo financeiro ganhar dinheiro em cima do contribuinte brasileiro. não é por outra razão que o real não pára de se valorizar, apesar da intervenção febril do BC. [3]
para conter a tendência de sobrevalorização da taxa de câmbio, além de baixar os juros e controlar fluxo de capitais especulativos de curto prazo, é necessário estabelecer um imposto sobre a exportação de commodities, criando um fundo internacional. apesar da tributação, os setores exportadores não têm perda de receita. o ganho com a estabilidade cambial repõe a despesa do imposto. [4]
para superar a rendição incondicional ao mercado a que o governo voluntariamente se entregou, há uma infinidade de opções.
no exemplo, um imposto – o que numa abordagem esquemática é prejudicial ao setor exportador – acaba trazendo vantagens. não apenas para os próprios exportadores, como para toda a economia.
as forças políticas e econômicas pensam e atuam com foco obtuso, movidas por interesses corporativos e sem abrir horizonte estratégico global.
o que os exportadores querem? exportar mais e melhor. precisam de uma taxa de câmbio competitiva e com retorno atraente em reais. isto é possível através de um instrumento aparentemente contraditório com seus interesses: uma tributação, que provoca efeito inverso de uma primeira análise apressada e obtusa.
o que os investidores querem? rentabilidade. podem conseguí-la aplicando em títulos públicos, asfixiando a economia com uma dívida interna crescente que suga recursos da produção através da gigantesca carga tributária necessária para arcar com os juros pagos pelo governo. ou podem financiar produção e consumo, via ativos modelados neste sentido.
basta uma redução na oferta dos títulos - por conta da queda dos juros e da conseqüente diminuição da dívida pública - para disponibilizar uma dinheirama no mercado, que financiará o desenvolvimento. os gestores terão que buscar ativos com rentabilidade para substituir títulos públicos. é erro pensar que o sistema bancário é quem irá prover recursos para financiar empresas e consumo. o funding será dado pelos fundos de investimento, financiando a produção por meio de debêntures e o consumo por meio de instrumentos como os Fundos de Direitos Creditórios (recebíveis, já regulamentados no Brasil). [5]
não existe antagonismo excludente entre exportações e mercado interno. assim como também entre mercado de capitais e desenvolvimento. o mesmo vale para pequenas empresas e transnacionais.
o nó que trava o desenvolvimento e mantém a extrema desigualdade social do país não está nessas oposições simplistas.
óbvio que o grande empresariado, o agronegócio exportador e o capital financeiro historicamente não construíram uma nação desenvolvida, com um forte mercado interno, socialmente justa e relevante na política internacional. inegável este fato. entretanto, a estratégia desses setores sempre foi dependente e associada – com o ápice de sua glória (e ocaso da nação) com os dois mandatos de FHC – que desde os anos 60 teorizou sobre a impossibilidade de um desenvolvimento autônomo, apresentando como única possibilidade a subordinação internacional e o crescimento com investimentos externos.
o que nos falta é tanto um governo quanto setores da sociedade civil (desde organizações de classe empresarial quanto sindicatos de trabalhadores - sem falar nos partidos políticos) com um claro e coerente projeto de articulação das forças produtivas brasileiras em torno de uma estratégia de desenvolvimento sustentado e includente.
[1] Luiz Carlos Mendonça de Barros, “Lula e seu keynesianismo”, 06/04/2007
[2] Bruno Galvão Santos, “A criminosa política monetária-cambial do Brasil”
[3] Luiz Carlos Mendonça de Barros, “Por que reduzir os juros”, 10/02/2006
[4] Luiz Carlos Bresser-Pereira, 16/05/2006
[5] Luís Nassif, “Fundos e investimento”, 14/08/2003
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