12 março 2008

parir o novo

para o mal ou para o bem Dilma Roussef se tornou a mãe do PAC. [1]

assim, através da Ministra-Chefe da Casa Civil virão à luz o teleférico do Complexo do Alemão, a elevação da via férrea e construção do parque em Manguinhos e a passarela assinada por Niemeyer na Rocinha.

enquanto providencia o parto das grandes obras que atendem o interesse das construtoras, Dilma se encarrega de justificá-las com as “obras sociais”: saneamento e reurbanização.

no início do primeiro mandato de Lula, Dirceu era reverenciado e temido como genial e implacável operador político.

acabou cassado. sofre processo como “chefe de uma organização criminosa”.

Palocci, por sua vez, se apresentava como pacificador dos mercados, âncora da estabilidade e o mais provável sucessor.

caiu por causa de um simplório caseiro. os mercados continuaram tão pacíficos e tão rentáveis como antes.

membros da equipe econômica não costumam ter problemas de emprego ao deixar o governo. em retribuição aos bons serviços prestados, logo são recompensados com cargos no alto escalão de empresas do mercado financeiro. para receberem o prêmio, contudo, mínima capacitação técnica é requerida. no caso de Palocci, para continuar se dedicando à causa dos banqueiros, só lhe restava a via parlamentar. [2] foi reeleito pelo lobby do sistema financeiro.

num governo em cujo céu há cada vez menos estrelas, agora é a vez de Dilma brilhar. quase solitariamente.

coube a José Dirceu consolidar no PT um modelo de campanha eleitoral financiado pelos grandes empresários e conduzido pelos marketeiros, levando ao afastamento da militância petista das ruas.

a Palocci também não faltou qualidades para articular a capitulação do PT a uma política econômica que faz com que Lula possa admitir, com certa dose de orgulho, que jamais banqueiros e grandes empresários ganharam tanto dinheiro quanto em seu governo, mesmo que os votos tenham sido para seu adversário.

de modo semelhante, Dilma é também muito competente em adotar a bandeira da gestão não-ideológica, desfraldada sem sucesso pelo candidato tucano derrotado nas eleições passadas.

Dilma faria parte de uma lenta, mas sistemática, aproximação dos quadros técnicos das funções-chave do governo, promovendo uma revolução gerencial que se encaminha lentamente para um ponto de equilíbrio, sem mudanças bruscas entre um governo e outro, em prol do equilíbrio do Estado. [3]

num país com desigualdades abissais e ainda no topo do ranking com a mais alta taxa de juros reais do mundo, deve ser algum tipo de sadomasoquismo se referir a "ponto de equilíbrio do Estado".

a grande novidade não é um “gestor não-ideológico”. para isto, há talento de sobra entre os inúmeros executivos das empresas brasileiras.

o que o Brasil precisa é de “gestão ideológica” de qualidade.

por sinal, algo que a Esquerda jamais conseguiu dar conta. e que Direita sempre fez com muita competência, mas nunca a favor dos interesses nacionais.

por que melhorar a gestão pública?

para que o governo gaste melhor. não necessariamente gaste menos, pode até vir a gastar mais com uma melhor gestão.

como o governo pode gastar melhor, se o maior gasto é com os juros da dívida pública?

neste ponto, Dilma tem demonstrado pouca capacidade de gerar alternativas e total inapetência em interferir politicamente.

outro ponto: como melhorar a gestão sem melhorar a gestão de pessoas?

porque gestão é fundamentalmente gestão de pessoas. não existe qualidade na gestão de processos sem qualidade na gestão de pessoas, já que são pessoas concretas que fazem funcionar os processos.

como ter uma boa gestão de pessoas sem destravar o nó provocado pela fisiologia do loteamento político nos órgãos públicos e empresas estatais?

aqui vale frisar que também há, e muito, loteamento político nas empresas privadas.

o mínimo de experiência na administração pública ensina que o corpo técnico e a gerência média é de tão boa qualidade (ou até supera) quanto nas empresas privadas.

ocorre que esta camada média da gestão pública é mantida refém da cúpula, onde estão os apadrinhados dos acordos fisiológicos.

não há como destravar este nó atuando apenas na superestrutura.

Dilma é o derradeiro capítulo da triste novela de se tentar no Brasil desenvolvimento sob a tutela do Copom.

Dilma é hoje o que Dirceu e Palocci foram no passado. e há grande chance de no futuro ela ser como eles são hoje.


não se trata de estratégia para o país, apenas um plano político para percorrer o caminho em direção a 2010.

entretanto, há pesadas e negras surpresas no horizonte, ainda em 2008.

erguer castelos de cartas pode ser tão doce ilusão. o duro tombo na realidade sempre desfaz fantasias.




[1] Dilma Roussef, 11/03/2008, assumindo a condição que lhe foi conferida por Lula, em discurso na Favela do Alemão, no Rio, em 07/03/2008
[2] arkx, “cartas de Palocci”, 05/03/2008
[3] Francisco, comentário no Blog do Nassif, 08/03/2008

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