07 agosto 2007

finge que funciona

em janeiro de 2005, o então prefeito de SP, José Serra, passou por uma situação constrangedora na inauguração de um posto de saúde.

na frente dos repórteres, após duas enfermeiras e a própria secretária municipal da Saúde não conseguirem - em sete minutos de tentativa - medir sua pressão arterial, devido a defeito no equipamento, Serra discretamente sussurrou:

"Finge que funciona..."

muitas vezes, não é necessário mais que breve murmúrio para a alma de um homem lhe escapar pelos lábios...

apenas três dias após o fim da greve do Metrô de São Paulo, o atual governador do Estado, José Serra, demite 61 funcionários da companhia.

em relação às empreiteiras da tragédia da cratera do Metrô de São Paulo, acidente ocorrido em 12/01/2007, Serra ainda não foi capaz de emitir um pio sequer...

tido por muitos como o político mais preparado do país para assumir a Presidência da República, Serra se limita a reproduzir a tradicional postura do homem público brasileiro: forte com os de baixo. enquanto mansamente rasteja solícito e submisso aos poderosos.

nada como um cargo executivo para que as máscaras caiam por terra.

Serra jamais escondeu que seu grande sonho na política é se tornar presidente do Brasil.

quem ainda precisará de Serra quando ele estiver com 68 anos? terá ele ainda alguma importância em 2010? talvez possa trocar uma lâmpada. ou cuidar do jardim. quem sabe levar os bisnetos prá passear... [1]

os industriais paulistas sempre se opuseram encarniçadamente aos direitos dos trabalhadores. repudiaram as primeiras leis promulgadas classificando-as como um "ensaio de socialismo de estado" no Brasil. entretanto, quando Getúlio consolidou a legislação trabalhista o que se deu, como resultado, foi um tremendo impulso ao crescimento da economia brasileira.

em 1927, publicação do Centro dos Industriais de Fiação e Tecelagem de São Paulo contestava a Lei de Férias, então de apenas 15 dias e promulgada em 24/12/1925, nos seguintes termos:

"o operário é um trabalhador braçal, cujo cérebro não despende energias. assim, é ilógico que o trabalhador braçal necessite de um período de descanso, pois nada, ou quase nada, pede ao cérebro – a não ser os atos habituais e puramente animais da vida vegetativa."

"o período de férias representa um perigo eminente para o homem afeito ao trabalho. nos lazeres e no ócio o trabalhador encontra seduções extremamente perigosas, se não tiver suficiente elevação moral para dominar os instintos subalternos que dormem em todo ser humano."

"o homem do povo não teve suas faculdades morais e intelectuais afinadas pela educação e pelo meio. sua vida física, puramente animal, supera em muito a vida psíquica. o que fará um trabalhador braçal durante o período de férias, se for compelido por uma lei? como não tem o culto do lar, procurará matar suas longas horas de inação nas ruas."

"o trabalhador é, pois, um elemento da coletividade que as férias estragarão." [2]

é muito bonito se falar na necessidade de um projeto para o país, mas a coisa começa a pegar quando se deve definir qual o papel dos trabalhadores neste projeto.

é muito cômodo propor um mercado regulado, e não aceitar que a única força capaz de regular o mercado são os trabalhadores, o trabalho.

sem direito de greve não há democracia.

o direito de greve no Brasil é um tabu porque nunca se criou aqui um mercado de massas. para se ter um mercado de massas é necessário uma população com poder aquisitivo. aqui se produz, aqui se vende, também. quem irá comprar com salários aviltados?

ocorre que todo o nosso modelo econômico, desde os tempos da colonização, sempre foi voltado para fora, dirigido de fora, para atender interesses de fora.

nunca houve qualquer motivo para se criar um mercado de massas. portanto, quanto menor o salário melhor. quanto menor os custos do trabalho, melhor!

não há democracia sem mercado de massas. não há mercado de massas com desemprego e salários rebaixados.

querem construir um país? defendam o direito de greve.

ou façam como José Serra, finjam que funciona...


[1] Beatles, “When I'm Sixty-Four”, música citada pelo então prefeito da cidade de SP, José Serra, em seu aniversário de 64 anos, referindo-se a sua provável candidatura ao governo do Estado.
[2] “Um ensaio de socialismo de estado no Brasil e as indústrias nacionais”, citado por Marisa Saenz Leme em “A ideologia dos industriais brasileiros”

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