14 setembro 2006

o adiamento de uma vitória anunciada

faltavam pouco mais de duas semanas para as eleições. a campanha de Lula mal conseguia disfarçar o eufórico clima de antecipada vitória. o Presidente-candidato estava tão confiante a ponto de anunciar um transubstanciação com os eleitores: cada um deles se tornara gota de seu sangue e célula de seu corpo.

excitados com a proximidade de uma reeleição anunciada, artistas colocavam de lado qualquer preocupação com a ética, assumindo que política se faz com as mãos sujas e com o que se tem.

apesar de alguns deles nem estarem assim supersatisfeitos, alegavam não ter alternativa. afinal, em termos de corrupção não se podia dizer que o governo Lula superasse o anterior.

intelectuais ludibriados, embora confessassem entre risadas como caíram na trapaça da cúpula do PT, não se envergonhavam em se declarar à disposição para serem mais uma vez enganados.

as pesquisas demonstravam claramente o fosso abissal que se escavara no eleitorado. as camadas mais pobres e de menor escolaridade estavam maciçamente com Lula. na mesma proporção, quanto maior a renda e o nível de instrução aumentava o apoio à oposição.

mais que um simples indicador sócio-econômico, a divisão revelava como o avanço da informalidade alterara o país, deteriorando a estrutura social e tornando a maior parte da população refém de políticas compensatórias.

então, tudo começou a mudar.

como sempre ocorre nestas situações, a princípio foi quase imperceptível. entretanto, a sequência dos fatos, quando analisada em retrospectiva, dá a impressão de ter sido orquestrada, como se o destino houvesse se encarregado de conspirar contra os rumos da história.

numa mesma semana se inverteu a sorte de Lula, o que ele só foi entender quando já era tarde demais.

auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) concluíra que o Governo não comprovara despesa de R$ 11 milhões, pretensamente gastos na impressão de cartilhas com propaganda oficial. tampouco há provas da distribuição de dois milhões dos exemplares efetivamente impressos. o Planalto justificou que o material foi entregue a diretórios do PT. alguns destes, contudo, afirmaram nada terem recebido.

no caso, o que incomodava o Governo não era a denúncia em si, mas a possibilidade de se chegar ao fio da meada do uso de superfaturamento com dinheiro público para financiar campanha política privada.

com o indiciamento de Palocci pela PF, voltaria à tona uma pergunta que não podia se calar: quais exatamente eram os negócios tratados pela república de Ribeirão Preto nas reuniões realizadas em Brasília na mansão dos prazeres ?

as peças se encaixavam e remetiam para a exumação de cadáveres de torpes assassinatos...

o fato mais importante, e decisivo, para a inversão do curso das eleições, aconteceria logo a seguir. a reputação pessoal de Lula, até então inexpugnável, estava prestes a ruir. sua arrogância em breve se transmutaria na depressão que, nos momentos de adversidade, lhe é tão característica.

como um mau presságio dos tempos que chegavam, naqueles dias Lula teve que cancelar um compromisso de campanha no Rio de Janeiro. com cerca de 15 minutos de vôo, o avião que o transportava sofreu uma pane e foi obrigado a retornar à Brasília. chegara o momento de sua campanha vir ao chão.

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