27 dezembro 2018

Brasil em Transe: a faca e o queijo, e a mão?

27/12/2018

"Aos amigos, tudo. Aos indiferentes, a Lei. Aos inimigos, a tortura."
sempre dito e repetido, dentro e fora dos quartéis, durante a Ditadura Civil-Militar (1964/1989).

o fim no Brasil do pacto da Nova República coincide com um realinhamento global do sistema de poder, num contexto de acirramento de crises econômicas.

neste perigoso e conturbado teatro de operações, os Generais tem uma guerra impossível pela frente.

o desempenho demonstrado na intervenção na segurança pública do RJ mostra o tamanho de seu despreparo para gerir a complexidade de um Brasil em escombros.

segundo o General interventor, todos os indicadores estão com viés de queda e a capacidade operacional dos órgãos de segurança foi recuperada, incluindo os valores.      

baseando-se exclusivamente em estatísticas convenientes e análises simpáticas, o General interventor orgulhosamente declara: "cumprimos nossa missão".

como sempre, o deserto do real não cabe na bolha da burocracia tecnocrática.

a recente mega-operação contra a milícia foi um fiasco. mesmo envolvendo 1.700 homens, dos 118 mandados de prisão apenas 27 foram cumpridos. o principal alvo, o líder da milícia local, conseguiu fugir. houve vazamento de informação.

missão dada, missão cumprida?

a realidade do dia a dia no varejo teima, ainda mesmo por agora e à luz do meio-dia, em contrariar o "viés de queda dos indicadores" apresentado pelo General interventor.

como poderia comentar, com lucidez e ousadia, o terceiro ditador do "MR-64" (Movimento Revolucionário de 31-MAR-1964): "Os indicadores vão bem, mas a segurança vai mal".

os Generais não poderiam hoje deixar de acrescentar: economia e povo vão mal. ao que nosotros retrucaríamos: mas se o povo vai mal, a economia de modo algum pode estar indo bem.

num diagnóstico correto, os Generais veem um Brasil à deriva e sem projeto para o futuro. ao que nosotros mais uma vez retrucaríamos: e qual Brasil projetam os Generais?

entre 1964 e 1968 os Generais adotaram uma política econômica recessiva. antes que a instabilidade resultante se tornasse incontrolável, Delfim fez a manjada mágica keynesiana do Milagre Econômico.

o bolo cresceu. ainda assim, nunca chegou a ser dividido antes de solar. sempre quem pagou a conta foram os trabalhadores.

agora vivemos inexoravelmente num outro mundo: não haverá retorno. nem aos supostos anos dourados do Lulismo. e muito menos ao milagre fake do "Brasil Grande".

se já não há mais viabilidade para qualquer terapia heterodoxa keynesiana, menos ainda quanto a um choque ultraliberal austericida.

enquanto Bolsonaro bate continência à ordem de um Imperium em decomposição, a macro-economia global jaz em profunda disfuncionalidade, com a mãe de todas as bolhas dando sinais de estar prestes a outra vez catastroficamente estourar.

por toda parte a Nova Ordem Mundial redundou numa desordenada fragmentação global. mas ao caos, o Imperium propõe nada mais do que ainda mais caos: "Hoje os Estados-Nação devem estar dispostos a abrir mão de sua soberania".

muito mais do que pelo voto anti-PT, Bolsonaro foi eleito por uma profunda e generalizada rejeição "contra tudo que está aí". um voto eminentemente anti-sistema.

e o que o sistema tem a oferecer? senão ainda mais endividamento e ainda menos renda, justo para quem demanda medidas urgentes para superar pouca renda e muita dívida...

se a lápide da Nova República é a dupla vitória de Bolsonaro (eleitoral e política), o túmulo do MR-64 foi cavado pela hiper-inflação, por uma faraônica dívida externa e por uma mega desigualdade social.

ironicamente, se foi por causa de uma crise global que os Generais anteriormente começaram a perder a solidez de seu chão,  é no bojo de uma outra crise iminente que marcham de novo ao comando do poder político.

novamente em Brasília, de onde, a rigor, nunca chegaram a sair, os Generais estão com a faca e queijo, mas e a mão?

"Duas batidas fortes e secas na porta da cozinha quebraram o silêncio noturno. Estava sozinho e raramente recebia visitas depois do anoitecer. Tampouco fazia sentido que tivessem batido na porta dos fundos.

Não reconheceu a pessoa. Era um homem de uns quarenta anos, corpulento, com aspecto de militar. Um coronel do Exército, foi a primeira coisa que pensou.

Convidou-o a entrar e se sentar à mesa da cozinha. Quase não trocaram palavras. Os cumprimentos de praxe e pouco mais.

O visitante abriu um notebook e acessou um vídeo que já havia separado. Apareceram três pessoas com uniforme militar e capuz escondendo seus rostos, com os pavilhões pátrios como pano de fundo.

Liam uma proclamação na qual ameaçavam juízes e promotores pelos processos que levaram à prisão oficiais por violações dos direitos humanos durante a ditadura, e anunciavam que providenciariam a libertação de seus "presos políticos".

Depois da exibição, o homem fechou o computador, se levantou, saudou-o e saiu pela mesma porta, que permanecera aberta.

Foi dormir sem dizer nada a ninguém. Mas é provável que tenha entendido a mensagem e agido em silêncio.

Sobre o caso das ameaças divulgadas no vídeo já havia uma investigação em curso. Acabou sendo arquivada. A advertência dos militares mais conservadores que acabou ficando só nisso.

E continuou a receber em sua casa no sítio ainda mais visitas do que antes."

"Uma Ovelha Negra no Poder. Confissões e Intimidades de Pepe Mujica", Andrés Danza e Ernesto Tulbovitz

vídeo: A Facada no Mito - versão com narração


vídeo: A Facada no Mito - Novo vídeo, novas Revelações


vídeo: ADÉLIO BISPO FAZENDO RECONHECIMENTO DA AÉREA ANTES DO ATAQUE


vídeo: Capitão Nascimento X Capitão Bolsonaro


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18 dezembro 2018

Brasil em Transe: todos os Generais do Capitão

18/12/2018

os Generais jamais chegaram ao poder pelo voto. em 1964 o fizeram com as tropas e os tanques. o bloco dominante julgava que após a "limpeza" os militares voltariam aos quartéis. rigorosamente falando, desde então jamais voltaram. por que agora o fariam?

os Generais estão em êxtase com o mito Bolsonaro, pois lhes dá algo que nunca tiveram: carisma popular.

apesar de seus os Três Primeiros-Filhos, apesar do escândalo do WhatsApp, apesar do Bolsogate dos assessores, apesar dos apesares, todos os Generais do Capitão o manterão inexpugnavelmente blindado. mas o mesmo não se pode afirmar acerca de seus entornos...

temos diante de nós a arquitetura em andamento de um novo sistema de poder. como em 1964, as mudanças institucionais que a Esquerda não pode, não soube e não quis fazer, serão agora os Generais seus executores.

e a Esquerda, tal qual existia até as Eleições de 2018, tornou-se irrelevante.

mais uma vez cercados pelo eterno retorno das espirais de farsa e tragédia da História, estariam os Generais em forma, por assim dizer, para vencer a circularidade e impor a diferença?

Golpe de 1964: abre-se um novo ciclo de acumulação capitalista no Brasil baseado na concentração, internacionalização e superexploração (Programa de Ação Econômica do Governo - PAEG).

Salário Mínimo: perda real de mais de 33% entre fevereiro de 1964 e março de 1968.

Concentração de Renda: 5% mais ricos aumentaram sua participação na renda nacional de 27,4% em 1960 para 36,3% em 1970.

Carga Tributária: 16% do PIB em 1963 para 23,8% em 1968.

Inflação: 25% em 1967 e 25,4% em 1968, bem acima dos 10% planejados e muito abaixo dos 79,3% em 1963.

PIB: abaixo dos 6% projetados, cresceu 3,4% em 1964, 2,4% em 1965, 6,7% em 1966, 4,2% em 1967, contra 8,5% a 10% durante o Plano de Metas de JK, 8,6% em 1961, 6,6% em 1962 e 0,6% em 1963.

Internacionalização: revogação dos artigos da Lei de Remessa de Lucros, que fixava um limite de 10% ao ano. empréstimos externos cresceram 65% entre 1964 e 1965, e os investimentos externos diretos triplicaram. abertura da exploração mineral a capitais privados e estrangeiros, com exceção do petróleo, do carvão e dos minérios ligados à área nuclear.


o caráter recessivo da política econômica leva ao acirramento da insatisfação social, inclusive entre setores da classe dominante, com a eclosão de grande manifestações de rua e a articulação da Frente Ampla de oposição.

o contra-ataque da Ditadura vem em pinça por duas frentes: o AI-5 aprofunda o estado policial e a repressão, enquanto  aumenta a ênfase no crescimento econômico.

sintomaticamente o Plano de Desenvolvimento Econômico (1968) não faz referências a metas de inflação. o PIB cresce 9,8% em 1968, iniciando-se o Milagre Brasileiro.

se o bolo cresceu sem nunca chegar a ser dividido, antes mesmo do impacto do Choque do Petróleo (1973) a solidez do "Brasil Grande" já começara a se dissolver no ar com o Crash das Bolsas no Brasil e o fim do padrão monetário Dólar-Ouro, ambos ocorridos em 1971.


além, é claro, a gigantesca incapacidade de trazer à luz do meio-dia as infâmias ocorridas nas trevas dos porões da Ditadura Civil-Militar.

Paulo Guedes, Roberto Campos, Delfim Netto, Mário Henrique Simonsen, Reis Veloso. Maluf. Paulo Maluf, o candidato civil do General-Presidente João Figueiredo - o último Ditador.

Paulipetro. Lutfalla. Camargo Corrêa. General Electric. Capemi. Coroa-Brastel. Grupo Delfin. Itaipu. Ponte Rio-Niterói. Transamazônica. Fraude do Farelo. contrabando na PE. Kruel. Amaury Kruel e suas malas de dinheiro.

Rua Tutóia. Ultragás. Operação Condor. Fleury. Malhães. Molina. Baumgartem. Tenente Odilon. Zé do Ganho, Pejota, Mariel Mariscot. todo grupo de extermínio acaba exterminando seus próprios membros.

a tortura que jamais houve, mas sempre existiu. a corrupção que não havia, mas sempre esteve lá. um Brasil feito por nós, mas desfrutado por eles. Ditadura nunca mais, ainda que perdure.

o maior e decisivo erro dos militares sempre foi supor ser possível desenvolver um país sem acionar o seu mais valioso recurso: o Povo.

muito mais do que pelo voto anti-PT, Bolsonaro foi eleito por uma profunda e generalizada rejeição "contra tudo que está aí". um voto eminentemente anti-sistema.

entretanto, ninguém melhor do que Bolsonaro para representar o que há de pior na classe dominante no Brasil: elitista, autoritária, machista, homofóbica, racista, discriminatória, preconceituosa, servil aos interesses externos, reacionária e de forte viés fascista.

ainda mais: quem tem sido os Generais senão o braço armado deste sistema? sempre um sistema político subordinado ao sistema econômico, do qual os Generais são a Garantia da Lei e da Ordem a serviço do grande Capital.

não importa quantos sejam os Generais do Capitão, eles já estarão de antemão derrotados caso não compreendam a especificidade de uma conjuntura completamente diferente de 1964 e de 1968,  frente a qual não há viabilidade para qualquer estratégia "lenta, gradual e segura".

as justas e urgentes demandas de uma população com pouco rendimento mas muito endividamento não lhes baterão continência, tampouco serão superadas na base do "prendo e arrebento" e "cadeia ou exílio".

estariam os Generais dispostos a quebrar seus próprios paradigmas e implementar medidas anti-sistema?

uma impiedosa, mas sempre magnânima História lhes estende a mão. afinal o que os Generais querem? mais uma vez tristemente se apagarem?
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17 dezembro 2018

Brasil em Transe: SitRep BolsoNazi - 02

17/12/2018

- após serem capitaneados triunfalmente de volta ao governo montados num cavalo chucro, afinal o que os Generais querem?

- a História é impiedosa, mas magnânima. sempre há muitas chances;

- teriam os Generais aprendido algo com a infâmia de seus porões e o fracasso de seu Milagre? ou o atoleiro do Haiti e o lodaçal da intervenção no Rio de Janeiro são provas recentes de que nada mudou? quem matou Marielle? e o suicídio do Gal. Urano e o "infarto fulminante" do Gal. Jaborandy?

- o conjunto do sistema global de poder está em transformação. apesar de periférico e dependente, o Brasil sempre teve uma função central neste sistema de poder: como fornecedor de matéria-prima barata, abundante e imprescindível para os sucessivos ciclos de expansão da economia mundial;

- a guerra comercial entre EUA e China é uma cortina de fumaça para encobrir o que de fato está em jogo: "o primeiro estágio de uma nova corrida armamentista para conquistar superioridade tecnológica de  longo prazo via Computação Quântica, Inteligência Artificial, Aviões de Guerra Hipersônicos, Veículos Eletrônicos, Robótica e Segurança Cibernética";

- até 2025 a China pretende substituir importações, para sua demanda ser atendida por produção própria em cerca de: 40% dos chips de celulares, 70% dos robôs industriais, 75% dos componentes básicos e 80% dos equipamentos de energia renovável;

- a indústria mundial de semicondutores é atualmente dominada por apenas seis empresas, nenhuma delas sediadas na China;

- o Brasil é o maior produtor de nióbio do mundo. o país detém cerca de 98% da reservas mundial desta matéria-prima usada na produção de semicondutores;

- Bolsonaro bate continência a um Imperium em decomposição, por toda parte a Nova Ordem Mundial redundou numa desordenada fragmentação global. a degradação das condições de vida da população dos EUA tem sua contraparte numa maioria da população chinesa submetida cotidianamente à tirania de um estado policial;

- a China não será nenhum hegemon dedicado a "construir um mundo desenvolvido, inclusivo e de paz". ao contrário, tende a ser ainda pior do que os EUA. um alinhamento incondicional do Brasil à China é tão, ou ainda mais, prejudicial quanto aos EUA;

- em transe, o Brasil continua vagando em num interregno. nenhum sistema de poder ainda em estruturação para se impor no vácuo da decomposição da Nova República. apenas sintomas mórbidos, criaturas monstruosas e fenômenos bizarros;

- a Esquerda brasileira fracassou. não apenas o Lulismo, todos! desde os progressistas até os radicais. o ciclo da redemocratização encerra-se com a volta dos militares à Presidência. o Brasil desperdiça sua chance de se tornar um dos principais tijolos dos BRICS, para viabilizar a construção de um mundo multipolar;

- a dimensão da gigantesca derrota da Esquerda no Brasil pode ser aferida na comparação entre duas situações: Lula apodrecendo numa cela fria numa sempre nublada Curitiba e os dois bombardeiros estratégicos russos pousando em Caracas;

- sempre tão obcecados em impedir o resgate do passado por parte das Comissões da Verdade, os Generais estão diante de um inesperado acerto de contas com seu fracasso anterior, quando tudo parecia tão sólido durante o Milagre Econômico;

- num Capitalismo Global em crise, não há qualquer viabilidade para uma neo-colônia semi-escravagista com 210 milhões de habitantes. esta é a verdade com a qual os Generais vão se encarar. não haverá como mantê-la em algum porão ou numa casa da morte.

o jogo não está jogado. ainda rolam os dados.

"- Chame o Capitão Maurício. Diga que é o Clamart, comandante militar da ALN.
- Alô. É você mesmo, seu terrorista filho-da-puta, quer se entregar ou agora se diverte passando trote?
- Filho-da-puta é você que tortura prisioneiros. Eu e Bacuri presenciamos a prisão de Letícia. Ela está grávida e foi afastada da militância direta. Não adianta torturá-la, não conhece nenhuma esquema, não pode entregar ninguém. Tenho uma proposta. Trocamos a vida dela e do bebê pela vida do general-comandante do II Exército.
- Está blefando, Clamart. Não tem condições de cumprir esta ameaça.
- Sigo o general há tempos. Localizei o fusca vermelho que ele usa para visitar a amante, incógnito e sem seguranças.
- Seu terrorista de merda. Eu te pego mais dia menos dia. Terei o prazer de te encher de porrada e de choque nos culhões. Te matar bem devagar.
[...]
- Alô, Clamart, o trato foi aceito. Apresentaremos Letícia à imprensa. Em troca vocês não divulgam a história do fusca e da amante do general.
- Fechado. Mas saiba que você não está incluído nisto. Se o encontro, mando bala, criminoso demente."
{fonte: "Viagem à Luta Armada", Carlos Eugênio Paz}


vídeo: RT correspondent witnesses landing of Russian Tu-160 bombers in Venezuela

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