01 outubro 2010

o espetacular tédio da política como espetáculo


ao fim dos mandatos duplos de FHC e Lula, a brutal desertificação realizada no cenário político brasileiro faz das eleições presidenciais de 2010 a de menor mobilização e participação popular desde a redemocratização do país.

como explicar que, com um Presidente no auge de seus recordes de popularidade e sua candidata em folgada dianteira nas pesquisas, ainda assim não haja qualquer euforia nas ruas?

formulada por marqueteiros bilionários, a política se empobrece, reduzido-se a fórmulas de marketing; extirpada da paixão, a política definha, aprisionada entre gráficos de pesquisas de popularidade e intenção de voto. reduzida a seu aspecto puramente parlamentar e focada no período eleitoral, a política acaba por se converter num espetáculo enfadonho e incapaz de atrair multidões às ruas, ocupadas apenas por militância remunerada.

sem a ânsia por transformação social, a política gira em torno de repetidos escândalos derivados de intensa corrupção, revelando apenas a irrelevância de uma política convertida na luta pelo poder do Estado travada por gangues patrimonialistas [1].

além de aplicar de modo magistral a receita econômica neoliberal, a mesma que fora apenas razoavelmente executada por FHC, Lula finda também por consagrar outro antigo projeto dos tucanos: enfim, uma política sem povo.

não porque definitivamente exclua qualquer possibilidade de participação popular, como no caso do PSDB; e sim por jamais alçar o povo a condição de sujeito da política, mantendo-o objeto de mecanismos assistencialistas com fins eminentemente eleitorais, no que o Bolsa Família lulista tem notável inserção na longa trajetória brasileira da cultura do favor.

nascido da organização de base dos movimentos sociais, o processo de criação do PT demonstra como a emancipação da classe trabalhadora deve ser obra dos próprios trabalhadores.

contudo, após 8 anos de governo Lula, completa-se uma viagem redonda, e o lulismo revira o PT ao avesso do avesso do avesso.

com sua base social num setor de baixíssima renda estruturalmente incapaz de se organizar, e também sem poder se representar, antes tendo que ser representado, [2] não há para lulismo motivo em temer alguma surpresa, como o surgimento de algum raio desde o alto irrompendo no céu azul. [3]

o subproletariado não deixará de obedecer com gratidão aos apelos a ele rogados por Lula: "Minha gente! Não me deixem só! Eu preciso de vocês." [4].



[1] Francisco de Oliveira, “Política numa Era de Indeterminação”
[2] Karl Marx, “O 18 Brumário”
[3] André Singer, "Raízes Sociais e Ideológicas do Lulismo"
[4] Fernando Collor, 2006 (pronunciamento feito durante o processo de impeachment

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