06 outubro 2006

secessão

o grande empresariado Paulista tem uma imagem extremamente peculiar de si próprio. sempre se considerou o portador da modernidade e exemplo de um Brasil que funciona e prescinde do Estado.

curiosa auto-definição para uma classe cuja origem não veio, como nos EUA, de camadas médias lutando pela independência do país, mas, ao contrário, nasceu dos antigos latifundiários e dos traficantes de escravos, contando com a proteção do Império e sempre agregada a sua contraparte internacional.

são os atuais descendentes dos “barões do café“, que produziam para exportar e não para abastecer o mercado interno, dependendo inteiramente do capital estrangeiro, tanto para a colocação internacional do produto quanto para a construção das ferrovias pelas quais escoava a produção.

é a brava gente que hoje prega um corajoso corte dos gastos públicos e defende uma redução generosa na carga tributária.

não se referem, é claro, a reduzir as despesas com os juros da dívida pública. já que, sem esforço, ganham nas aplicações em títulos federais, investimento sem risco garantido pelo Estado, uma rentabilidade maior do que conseguiriam em qualquer atividade produtiva.

como sempre, propõe corte na carne alheia.

as despesas com os serviços públicos que atendem a maior parte da população oscilaram, nos últimos dez anos, em torno de 17% do PIB, sem grande variação.

já a dívida pública segue acima de 50% do PIB, alimentada pela maior taxa real de juros do mundo. os gastos com os juros atingem 8% PIB, com cerca de 80% dos títulos concentrados em apenas 15 mil famílias.

tamanha transferência de riqueza é sustentada por uma carga tributária de 37% do PIB, dos quais apenas 33% são oriundos de receitas, enquanto 67% provêm das contribuições.

ou seja, tanto os rendimentos com os juros da dívida pública, quanto o sistema tributário, são altamente concentradores de renda, beneficiando as camadas mais ricas da população.

apesar disto, nossa brava gente vê, quando examinam o resultado do primeiro turno das eleições de 2006, ao Norte e Nordeste um Brasil vermelho, pobre e dependente do Estado, que seria sustentado pelos impostos arrecadados no Brasil rico do Sul e Centro-Oeste, colorido com o azul da economia de mercado.

FEBRABAN e FIESP ainda não se libertaram do modelo da Abolição da Escravatura. quem tem direito à indenização é o senhor, afinal foi expropriado de seus “meios de produção“, e não o escravo a quem negaram a condição humana.

não é que falte fé no povo para nossas classes dominantes, não têm fé em si mesmas. desconfiam de suas próprias palavras de ordem. divulgam chavões em vez de idéias. intimidadas pela crise do país, mas dela desfrutando. vulgares porque nunca foram originais e originais em sua vulgaridade. sem energia, em nenhum sentido, plagiaria em todos os sentidos.

não avançaram nem avançam para um projeto político alternativo para a sociedade nacional. jogam com as classes subalternas de modo tímido, pouco elaborado. temem a força política dessas classes, principalmente o risco de ter de compartilhar o poder. não construíram nem constroem um projeto de cunho hegemônico, porque não interpretam os interesses das outras classes e muito menos da sociedade como um todo. apenas defendem seus próprios interesses corporativos.

nestas eleições, apóiam um candidato com perfil similar ao que possuem, embora tudo façam para negar esta condição para si próprias. em vez de progressista, Alckmin é católico conservador; em vez de cidadão cosmopolita, ostenta com orgulho a marca do interiorano; em vez de sociólogo ou economista, é um gerente pós-ideológico.

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